Instituto Hercule Florence ganha página no Google Arts & Culture  

Com acesso gratuito, plataforma mostra a arte e a ciência do pioneiro do processo fotográfico no século 19

 07/08/2020 - Publicado há 4 anos
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Hercule Florence, Apiacás – Divulgação/Academia de Ciências de São Petersburgo

A história do desenhista e pintor autodidata Hercule Florence, que nasceu em Nice, na França, em 1804, desembarcou aos 20 anos no Rio de Janeiro como desenhista da Expedição Langsdorff – de 1825 a 1829 – e viveu em Campinas (SP), foi contada em livro, pela primeira vez, em 1976, numa pesquisa do professor Boris Kossoy, da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP. Três décadas depois, Kossoy lançou uma edição revista e ampliada pela Editora da USP (Edusp). Hercule Florence: A Descoberta Isolada da Fotografia no Brasil passou a ser referência para o reconhecimento internacional do pioneiro do processo fotográfico no século 19. E, neste ano, às vésperas de ser lançada a quarta edição do livro, o Instituto Hercule Florence (IHF) apresenta a trajetória e as obras do artista e inventor na plataforma digital Google Arts & Culture.

Com isso, o instituto está ao lado de mais de 2 mil museus e galerias de todo o mundo. A plataforma disponibiliza 87 obras, além das anotações do pintor observando a paisagem brasileira.

 

O professor Boris Kossoy e Antonio Florence, tetraneto do artista francês, juntos na preservação e difusão da obra de Hercule Florence – Foto: Divulgação

 

O visitante vai navegar com o jovem irrequieto que sonhava com as aventuras de Robinson Crusoe. Vai acompanhar o artista inventor por uma viagem fluvial do Tietê ao Amazonas através das províncias brasileiras. E voltar no tempo para conhecer o Brasil entre 1825 a 1829.

Poderá identificar, em seus desenhos, um registro do cotidiano dos índios e também cidades como o Rio de Janeiro, com o Pão de Açúcar e o Corcovado. Paisagens em traços leves acompanhadas de anotações como esta: “A 3 de setembro de 1825, partimos do Rio de Janeiro. Um vento fresco ajudou-nos a vencer, em 24 horas, a travessia de 70 léguas, até Santos”.

 

Os objetivos do Instituto Hercule Florence são a coleta, organização, conservação e divulgação da bibliografia e de documentos sobre o século 19 brasileiro.”

 

Os manuscritos e as imagens foram extraídos da edição fac-símile do livro L’Ami des Arts Livré à Lui-Même, apontada como a obra mais importante de Hercule Florence. “Por ter sido um dos principais retratistas do Brasil do século 19, o Instituto Hercule Florence foi procurado pelo Google Arts & Culture para que sua iconografia fizesse parte da plataforma. Essa inclusão dará ao artista visibilidade universal”, afirma Antonio Florence, tetraneto de Florence, que fundou o instituto em 2007. “Os objetivos do instituto são a coleta, organização, conservação e divulgação da bibliografia e de documentos sobre o século 19 brasileiro, reunindo um acervo próprio composto de biblioteca e arquivos especializados.”

 

Hercule Florence, Indienne Apiacá – Divulgação/Academia de Ciências de São Petersburgo

 

O centro de interesses do Instituto Hercule Florence é o estudo dos diversos viajantes do século 19 e suas narrativas, além da produção da Expedição Langsdorff, missão científica que percorreu o interior do Brasil, de São Paulo até o Amazonas, resultando em um minucioso levantamento de dados geográficos e etnográficos do País. Em uma das anotações, Florence observa o drama dos viajantes contraindo uma doença que desconheciam e que os estudiosos acreditam ter sido a malária: “Salto Augusto (2 de maio de 1828) – Atacadíssimos pela doença, permanecem privados da mínima ação os Srs. de Langsdorff e Rubzoff. Tão fracos se sentem que lhes é impossível abandonar a rede. Somos unicamente 15 os que nos conservamos com saúde, num conjunto de 34 pessoas, das quais apenas oito se livraram das sezões.”

No final dessa expedição, Hercule Florence resolveu ficar na vila de São Carlos, atual Campinas, em São Paulo, onde constituiu família e ficou até a sua morte, aos 75 anos, em 1879.

 

As realizações de Hercule Florence em variados campos das ciências e da artes são de importância definitiva para os estudos da cultura brasileira.”

 

Boris Kossoy, estudioso da trajetória de Hercule Florence desde 1972, acredita que, com a inclusão do instituto na plataforma Google Arts & Culture, o acervo e também os estudos sobre o artista francês em diferentes áreas ganham maior visibilidade. “O contato entre o Google e o instituto se dá em função da diversidade das referências iconográficas relativas à Expedição Langsdorff, uma das mais importantes missões científicas que visitaram o Brasil no século 19, além dos relatos de pesquisas com a zoofonia, poligrafia e a fotografia, dentre outras investigações do inventor que constam dos seus diários, hoje recuperados e disponibilizados on-line.”

 

Página do livro L’Ami des Arts Livré à Lui-Même, de Hercule Florence – Reprodução

 

Na avaliação de Kossoy, o interesse entre o Google e o Instituto Hercule Florence se deu em função da exposição O Olhar de Hercule Florence sobre os Índios Brasileiros, realizada em 2015 na Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP. “Essa exposição aconteceu por ocasião do seminário internacional Índios no Brasil; Vida, Cultura e Morte promovido pelo Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação da USP, que deu origem a um livro com o mesmo nome organizado pelas historiadoras Maria Luiza Tucci Carneiro e Miriam Rossi.”

Segundo Kossoy, “em termos da divulgação global, que ora se faz da obra de Florence, é importante a comprovação da descoberta de um processo fotográfico em 1833”. O professor destaca outras atividades do instituto, como o lançamento, em 2018, do fac-símile do manuscrito L’Ami des Arts Livré à Lui-Même. “Através dessa edição todos puderam conhecer Hercule Florence, sua autobiografia e seus trabalhos, uma obra que reúne um tesouro de informações da maior importância para os estudos da cultura brasileira, com a excelência da qualidade gráfica e editorial.”

 

Hoje, felizmente Hercule Florence é reconhecido como um dos inventores da fotografia, ao lado de Nièpce, Daguerre, Fox Talbot e Hippolyte Bayard.”

 

Kossoy faz uma síntese da trajetória de Hercule Florence. “Suas realizações em variados campos das ciências e das artes são de importância definitiva para os estudos da cultura brasileira”, acentua. “Exemplo disso é a documentação iconográfica da Expedição Langsdorff, que registra com apuro técnico e artístico a flora, a fauna, costumes, populações indígenas de diferentes grupos, entre outros temas. Se pensarmos no âmbito das artes gráficas, a descoberta de um meio de imprimir foi uma das motivações prioritárias de Florence, pois não se conformava com a falta de equipamentos gráficos de impressão, como a tipografia, no País.”

 

Hercule Florence,  Salmo Dourado – Reprodução

 

O professor conta que a questão de Florence era como multiplicar o conhecimento e as informações. Trabalhou arduamente nesse sentido a partir de 1830 e desenvolveu um meio prático e barato de impressão ao qual deu o nome de poligrafia, um processo que mereceria aperfeiçoamentos durante muitos anos. A seguir, junto com suas experiências com a poligrafa, foi informado que determinados materiais fotossensíveis, como o nitrato de prata, tinham a propriedade de escurecer pela ação da luz.

Desde 1833, Florence já obtinha resultados satisfatórios em seu intuito de “imprimir” por esse método, além de descobrir também a obtenção de imagens em papel quando colocado na “camera obscura”. O professor lembra que, no decorrer da década de 1830, o inventor e artista aperfeiçoou seu processo descobrindo inclusive uma forma de “fixar” as imagens de modo que se tornassem permanentes. Quando a descoberta de Daguerre foi anunciada na França, em 1839, Florence já imprimia, em série, diplomas maçônicos e rótulos para a identificação de atividades comerciais. “Sua descoberta não prosperou no meio caboclo e escravocrata em que viveu, permanecendo no anonimato por cerca de 140 anos. Hoje, felizmente Florence é reconhecido como um dos inventores da fotografia, ao lado de Nièpce, Daguerre, Fox Talbot e Hippolyte Bayard.”

 

Hercule Florence, Chef Mundurucu – Divulgação/Academia de Ciências de São Petersburgo
Página de rosto de L’Ami des Arts Livré à Lui-Même, de Hercule Florence – Reprodução

 

A página do Instituto Hercule Florence (IHF) na plataforma Google Arts & Culture pode ser acessada gratuitamente através deste link.


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