O Grupo aMuDi, formado por alunos da USP, com nome em light painting – Foto: Divulgação/Grupo aMuDi

Alunos da USP cruzam as fronteiras entre tecnologia e arte

Entre autofalantes de plasma e uma impressora de poemas, o Grupo aMuDi cria projetos que misturam esses dois mundos do conhecimento

Cada vez mais a tecnologia influencia o modo como se faz arte, e o encontro entre essas duas áreas se torna  mais comum. Um dos espaços onde esse encontro acontece é o Grupo aMuDi, uma iniciativa nascida na Escola Politécnica da USP em 2008, cuja proposta central é fundir a arte com o conhecimento tecnológico. Criada como grupo de extensão por alunos da graduação e pós-graduação, o aMuDi não se limita aos alunos de engenharia, mas aceita integrantes de qualquer disciplina.

O estudante Nicholas Shiroma, da Escola Politécnica da USP – Foto: Reprodução/Facebook

Combinando vários conceitos da engenharia, computação e outras áreas das exatas, o aMuDi cria obras interdisciplinares que pretendem demonstrar que a tecnologia também é um meio pelo qual podemos nos expressar. As obras do grupo já utilizaram, por exemplo, conceitos da eletrônica, da realidade virtual e da matemática.

Nicholas Shiroma, aluno do curso de Engenharia Mecatrônica da Poli e membro do aMuDi, cita duas obras que, segundo ele, sintetizam a proposta do grupo. “A primeira é o Beabá, releitura de obra do artista Waldemar Cordeiro. É uma impressora automática de poemas em formato de soneto, com a peculiaridade de que as palavras geradas não existem.” Shiroma explica que o sistema funciona por meio de uma biblioteca de palavras que foram divididas em sílabas, a partir das quais novas palavras são criadas e inseridas nos poemas. Esse processo gera, a cada impressão, um poema completamente único, composto de palavras cujos significados são, então, atribuídos pelo leitor.

Uma das interações da obra Pièce de Résistance, do Grupo aMuDi – Foto: Divulgação/Grupo aMuDi

A segunda obra citada por Shiroma é chamada Piece de Resistance, uma sátira de A Traição das Imagens, do pintor surrealista belga René Magritte, conhecida pela frase “Ceci n’est pas une pipe” (“Isto não é um cachimbo”). “Em vez de um cachimbo, utilizamos um resistor, que é um elemento elétrico, utilizado em diversas aplicações”, conta Shiroma. A obra, composta de um resistor acoplado a uma tela bege, sobre as palavras “Ceci n’est pas une résistance”, é afixada em diferentes locais, para então ser monitorada durante o tempo em que ela permanece lá, a fim de verificar que ações sofre, seja do ambiente, seja humana.

Para Shiroma, ela também acaba sendo profunda, justamente pelo fato de “resistência” ter vários significados. “Seja individualmente (cada um tem a sua luta para travar, suas prioridades), seja coletivamente, como sociedade, devemos sempre prezar pelo bem do próximo, defender a democracia.”

Sobre as obras, o estudante comenta que, com diferentes graus de dificuldade para execução, “cada uma é especial por causa da interação e do impacto que causa ao interlocutor”.

Apesar de o Grupo aMuDi também auxiliar em obras de outros artistas, a maioria dos projetos do grupo é independente. Nicholas Shiroma explica que, após uma ideia ser proposta por um membro e discutida, grupos menores se formam para realizar o projeto. Como o grupo combina estudantes de diferentes áreas, uma gama de conhecimentos é misturada nos projetos. “Por serem ideias e projetos bem diversos, na maioria das vezes a gente não vai ter todo o know how do projeto, Então, no fim, qualquer pessoa consegue se encaixar e produzir”, conta. “O aMuDi nos proporciona essa possibilidade de transformar algo técnico, validado e aplicado como as ciências exatas, em uma obra sinestésica, não formatada e subjetiva como a arte. Cada participação nos molda como artistas, estudantes e futuros profissionais.”

Obra Realidade Diminuída, na qual o usuário utiliza óculos de realidade virtual para observar um painel e as coisas que ocorrem nele, e nada mais. Quem está por fora, porém, não consegue observar o que acontece no painel – Foto: Divulgação/Grupo aMuDi

Shiroma pensa que não existe uma separação rígida entre arte e tecnologia. “Acredito que são duas linguagens tentando falar sobre o mesmo assunto, ou dois lados de uma moeda só. O que pode acontecer é não valorizarmos com a mesma veemência ambas as coisas.” Para ele, os projetos do aMuDi já seguem um padrão que vem se mostrando nas duas esferas. “É bem comum notar grupos de projetos interdisciplinares em departamentos de pesquisa e desenvolvimento nas empresas grandes. Existe também a vertente de arte cinética, que envolve mecânica, para conseguir formar obras com movimentos fluidos e repetitivos.” Para ele, o futuro da arte é ainda mais interdisciplinar: “Fico ansioso em pensar que o futuro da arte seja bastante integrado com a tecnologia, atravessando ainda mais as outras áreas do conhecimento, seja medicina, psicologia, arquitetura, engenharia e profissões que ainda nem foram criadas”.

Mais informações sobre o Grupo aMuDi estão dispníveis no site do grupo e no Facebook.