Resíduos da indústria de bebidas são usados para produzir corantes naturais

Leveduras descartadas de cervejaria são aproveitadas para encapsular pigmentos feitos de cascas e sementes de jabuticaba e uva

 16/09/2021 - Publicado há 3 anos     Atualizado: 20/09/2021 as 14:48

Por: Júlio Bernardes

Arte: Rebeca Alencar

Na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) da USP, em Pirassununga, pesquisa aproveitou subprodutos do processamento de bebidas e da jabuticaba para a produção de corantes naturais encapsulados. Por meio de técnicas já disponíveis na indústria, o trabalho usou leveduras descartadas de cervejaria para encapsular e proteger pigmentos extraídos de sobras, cascas e sementes da produção de vinho e do despolpamento da jabuticaba. O produto foi testado como corante para iogurtes, com resultados positivos, como o acréscimo de proteínas, vitaminas e outros nutrientes, além da aprovação em testes sensoriais. Os pesquisadores apontam que as leveduras têm potencial para agregar compostos bioativos a suplementos alimentares e em outros produtos alimentícios, entre os quais derivados de carne e de leite.

“O projeto aproveitou a estrutura da célula da levedura, que se assemelha a uma cápsula, para incorporação e proteção de pigmentos naturais extraídos dos resíduos da indústria vinícola e do despolpamento da jabuticaba”, descreve ao Jornal da USP a pesquisadora Fernanda Thaís Vieira Rubio, que realizou o trabalho durante o doutorado na FZEA. “Assim, buscou-se atender ao apelo dos consumidores por aditivos naturais e saudáveis e o das indústrias de corantes, por ampliar a oferta de aditivos naturais, estáveis, saudáveis e que possam oferecer algo a mais à saúde do consumidor.”

Nos recipientes A e B estão os iogurtes com pigmento obtido pela encapsulação do extrato de bagaço de uva. O C e o D contêm iogurtes com pigmento produzido pela encapsulação de extrato dos subprodutos de jabuticaba  – Foto: Cedida pelas pesquisadoras

A levedura residual empregada no trabalho foi doada pela cervejaria Hausen Bier, de Araras, após seu uso na fabricação de cerveja. “Foram utilizadas duas matérias-primas como fonte de pigmentos neste trabalho, o bagaço de uva da variedade Bordô e subprodutos do despolpalmento de jabuticaba, consistindo de cascas e sementes”, aponta a pesquisadora. “A partir destes coprodutos, foram produzidos extratos que foram misturados com as leveduras residuais para posterior encapsulação.”

Para encapsular os pigmentos, foi adotada a técnica de biossorção seguida da atomização ou spray-drying, que consistiu em pulverizar a mistura de extrato e levedura em uma câmara com ar quente. “Ao entrar em contato com o ar quente, a secagem da mistura é feita instantaneamente e o encapsulado é produzido”, ressalta Fernanda. “Após a encapsulação, o pigmento estava protegido e tinha alto valor nutricional, em razão dos nutrientes presentes nas leveduras, tais como proteínas, carboidratos e vitaminas do complexo B, e também funcional, devido aos compostos fenólicos presentes nos extratos vegetais.”

Aplicações

A pesquisa testou o uso dos pigmentos encapsulados como corantes naturais em iogurtes, com resultados positivos. Fernanda aponta outras aplicações em potencial das leveduras enriquecidas com compostos bioativos. “Elas podem ser usadas em suplementos alimentares e como aditivos em outros produtos alimentícios, como lácteos, produtos cárneos e extrusados (salgadinhos)”, destaca.

“O equipamento spray dryer já é amplamente conhecido e utilizado na indústria alimentícia e a atomização é um dos métodos mais comuns de secagem. Portanto, o maior desafio para a indústria seria somente o fornecimento das matérias-primas necessárias.”

De acordo com Fernanda, a avaliação sensorial dos iogurtes enriquecidos com os pigmentos à base de leveduras foi aceita pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (CEPH) da FZEA. “Para a avaliação, 120 provadores foram recrutados entre alunos e funcionários do campus de Pirassununga. Os iogurtes foram avaliados com índices de aceitação variando entre 73,9% e 81,4%, o que indica que as amostras foram bem aceitas pelos consumidores”, relata. “Os provadores também indicaram intenção de compra dos produtos, caso estes viessem a ser comercializados.”

“Tivemos a preocupação de desenvolver um processo simples, tanto no preparo das matérias-primas quanto na produção dos encapsulados, justamente para facilitar a produção em escala industrial”, afirma a pesquisadora. “O equipamento spray dryer já é amplamente conhecido e utilizado na indústria alimentícia e a atomização é um dos métodos mais comuns de secagem. Portanto, o maior desafio para a indústria seria somente o fornecimento das matérias-primas necessárias.”

A pesquisa é parte do doutorado de Fernanda Thaís Vieira Rubio, com bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), com supervisão da professora Carmen Sílvia Fávaro Trindade. A aluna de graduação Mayara Martins dos Santos participou na produção dos pigmentos durante sua iniciação científica, financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Também colaboraram com o estudo os professores Charles Windson Isidoro Haminiuk, Milena Martelli Tosi, Izabel Cristina Freitas Moraes e o técnico especialista do Laboratório de Encapsulação e Alimentos Funcionais, Marcelo Thomazini. O laticínio-escola do campus de Pirassununga forneceu o iogurte utilizado na pesquisa, e todo o restante do trabalho foi desenvolvido nas dependências da FZEA.

Mais informações: e-mail fernanda_rubio4@hotmail.com, com Fernanda Thaís Vieira Rubio

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