Ilustração: Wikihow

Pesquisas buscam reduzir tempo de recuperação de ossos fraturados

Cientistas desenvolvem esferas nanométricas que simulam o comportamento das vesículas ligadas à formação dos ossos. No futuro, técnica poderá otimizar reconstituição óssea

20/10/2020

Taína Lourenço

Imagine que, após sofrer uma fratura óssea que levaria de 30 a 40 dias para se recuperar, seu médico sugere um novo tipo de tratamento que pode diminuir o tempo da reconstituição do osso quebrado para, pelo menos, a metade desse período. Essa realidade está cada vez mais próxima com os estudos do Departamento de Química da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP.

A novidade vem dos laboratórios de Nanobiotecnologia Aplicada: Sistemas Miméticos de Biomembranas e de Físico-química de Superfícies de Colódios, coordenados pelos professores Pietro Ciancaglini e Ana Paula Ramos, respectivamente. Os cientistas estão produzindo pequenas esferas nanométricas, ou seja, com um bilionésimo de metro, que simulam o comportamento de vesículas que participam do processo de formação óssea dentro do nosso organismo.

Ciancaglini trabalha na produção das vesículas sintéticas e a imobilização funcional e seletiva de proteínas osteogênicas, que têm um papel importante na biomineralização. O professor afirma que essas esferas, conhecidas como vesículas da matriz, são as responsáveis por levar até a matriz extracelular do osso os componentes necessários para dar início à formação óssea. “Essas vesículas brotam da própria célula responsável pela formação óssea. Dentro delas (vesículas) estão contidos minerais de fosfato de cálcio que se reestruturam e formam um tipo de mineral, chamado apatita biológica, que cresce até romper as paredes da vesícula, para então se acumular na superfície das fibras de colágeno, que se organizam e, por fim, formam a estrutura óssea.”

Ciancaglini conta que, nos últimos anos, os laboratórios têm se especializado na produção de compostos, lisossomos esféricos formados apenas por lipídios, que simulam a mesma ação das vesículas da matriz. Os pesquisadores, diz o professor, isolam cada uma das proteínas que participam da mineralização óssea e colocam dentro das simulações de vesículas para então analisar a função de cada um dos agentes produtores de ossos.

“Nós isolamos uma proteína de cada vez e colocamos na vesícula e estudamos seu papel na finalidade de transportar o cálcio, de interagir com a fibra de colágeno, na propriedade de hidrolisar um substrato. É como se fosse um quebra-cabeças. Eu faço a vesícula no laboratório, que é um mimético da vesícula que aparece naturalmente, coloco a proteína, entendo como cada uma funciona separadamente e depois faço um sistema mais complexo. Vou montando o quebra-cabeças de novo e vejo como uma proteína afeta a outra.”

Pietro Ciancaglini - Foto: Serviço de Comunicação Social/RP
Pietro Ciancaglini - Foto: Serviço de Comunicação Social/RP

Ciancaglini diz que o objetivo final é chegar a um componente que reúna todas as proteínas essenciais para a formação de ossos para, então, usar esse conhecimento em possíveis tratamentos que envolvam a regeneração óssea, como em casos de fraturas e implantes de suportes de titânio, por exemplo.

“Já pensou se você tem uma fratura e eu injeto um mimético que, em quatro dias, pode restabelecer seu osso? Vai ter uma recuperação muito mais rápida e vai precisar de uma fisioterapia de tempo menor, porque ficou menos tempo parado. Em todo processo de recuperação você tem um ganho”, conta.

Segundo o professor, a descoberta também pode trazer benefícios em casos de implantes. Ele explica que, para organismos que rejeitam as placas de titânio, a adaptação pode acontecer de forma mais rápida, pois “a ideia é cobrir a superfície do titânio com aquelas proteínas importantes e no lugar de esperar, às vezes 90 dias, para continuar com o procedimento. Esse pino será soldado imediatamente, permitindo uma recomposição da estrutura dentária do paciente em um menor espaço de tempo”, afirma.

Imagens de uma vesícula da matriz: A – Microscopia eletrônica de Transmissão (MET) e B – Microscopia de Força Atômica (AFM) [Retirado do artigo: Bottini et al., 2018 - BBA - General Subjects 1862 (2018) 532–546]

Ciancaglini diz que essa ainda é uma ideia para ser desenvolvida em um futuro próximo e que, enquanto o tempo de inovação não chega, os pesquisadores trabalham para produzir as vesículas que serão utilizadas na aplicação. “Almejamos lá na frente conseguir fazer um mimético com os componentes proteicos essenciais em uma vesícula produzida em laboratório que simula a vesícula natural.”

Os resultados das últimas pesquisas realizadas pelo professor Pietro Ciancaglini em parceria com as professoras Maytê Bolean Correira e Ana Paula Ramos, ambas da FFCLRP, estão no artigo Miméticos de Vesículas da Matriz, publicado na revista Conectividade Óssea, da Associação Brasileira de Avaliação da Saúde Óssea e Osteometabolismo.

Mais informações: e-mail pietro@ffclrp.usp.br


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