Fotomontagem com imagens de Pixabay e Wikimedia Commons

Pesquisadores da USP trabalham em uma cerveja artesanal probiótica

Entre vários objetivos está o desenvolvimento de novas leveduras não alcoólicas para elaborar cervejas sem álcool que tenham menos diferenças no sabor em relação à cerveja convencional; cajá é o fruto estudado

 02/03/2023 - Publicado há 1 ano

Redação

Arte: Joyce Tenório

Pesquisadores do Centro de Pesquisa em Alimentos (Food Research Center – Forc) querem otimizar os benefícios do aumento de microrganismos benéficos na microbiota intestinal a partir do consumo moderado de cerveja. Com o cajá, um fruto também conhecido como taperebá, muito popular na região Norte do País, os cientistas desenvolveram uma cerveja artesanal potencialmente probiótica.

Probióticos são microrganismos vivos, geralmente bactérias, muitas vezes adicionados em alimentos para se alojarem principalmente no intestino e assim produzirem efeitos positivos na saúde. Neste caso, conforme estudo publicado na revista científica Foods, foi usada a bactéria Lacticaseibacillus paracasei F19. Entre outros benefícios reconhecidos, essa bactéria traz ganhos para a digestão de alimentos e a absorção de nutrientes — o que se avalia ter efeito contra a obesidade, com resultados positivos em estudos com modelos animais — e no fortalecimento do sistema imune.

Coordenada por Susana Saad, professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP e integrante do Forc, na pesquisa foram feitas quatro formulações da cerveja, todas com os ingredientes básicos da bebida (água, malte, lúpulo e levedura). Em uma versão foram adicionados o probiótico e o suco do cajá; em outra, o probiótico e o bagaço da fruta; uma terceira, o probiótico com o suco e o bagaço combinados; e uma quarta, só o probiótico – funcionando como o grupo controle.

Categoria Sour

Além de análises de compostos voláteis, como álcoois, ésteres e terpenos, que conferem aroma e sabores, as formulações passaram por avaliações sensoriais com 117 voluntários. Sem saber qual das quatro estavam provando, os voluntários deveriam dizer o quanto gostaram da bebida (numa escala de um a nove) e qual a probabilidade de comprarem a cerveja se essa estivesse à venda no mercado (numa escala de um a cinco). Também deveriam descrever sensações relativas ao sabor.

“Três delas obtiveram nota seis de aprovação e três de consumo. Se destacou a formulação feita com o suco, que obteve notas sete e quatro, respectivamente. No geral, eles aprovaram a acidez, que é um diferencial potencializado pelo probiótico”, conta Ana Beatriz Praia, mestre em Tecnologia Bioquímico-Farmacêutica pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP e primeira autora do estudo.

Ana Beatriz Praia. Foto: Currículo Lattes/Reprodução

“A fruta e seu subproduto foram utilizados exclusivamente com o intuito de dar sabor à cerveja. No geral, o resultado foi uma cerveja leve, refrescante e ácida, o que a coloca na categoria de cerveja Sour. Boa para o clima brasileiro, especialmente no verão”, acrescenta Marcos Herkenhoff, pós-doutorando em genética de microrganismos cervejeiros na FCF e coautor do estudo.

Combo de benefícios

Em relação à quantidade de bactérias Lacticaseibacillus paracasei F19, todas as formulações conseguiram manter uma quantidade de microrganismos entre 22% e 40% menor do que a produzida pelo grupo controle (ingredientes básicos mais o probiótico). “Isso mostra que há uma chance grande dessas cervejas manifestarem os efeitos do probiótico esperados. Se os níveis de bactérias são suficientes para isso, precisaremos verificar em estudos com animais e clínicos”, explica Herkenhoff.

Segundo ele, além do potencial probiótico, as cervejas obtidas na pesquisa têm menor valor energético por conta da fermentação alcoólica, produzida pela sua levedura, e a fermentação lática, gerada pelo probiótico. Com isso, são dois microrganismos consumindo carboidrato, o que não ocorre nas cervejas convencionais. “Por haver duas fermentações, o seu teor alcoólico também é menor: fica entre 2,6% e 3,4%, enquanto o teor médio de uma cerveja convencional varia entre 4,8% e 5,2%.”

Marcos Herkenhoff. Foto: Arquivo pessoal/Reprodução

O desenvolvimento de uma cerveja à base do bagaço do cajá também poderia beneficiar a cadeia produtiva do fruto. O cajá é produzido principalmente na agricultura familiar e é muito utilizado no Norte do País em sucos, sorvetes e doces em geral. Geralmente aproveita-se o suco e se descarta o bagaço. “Essa parte do estudo foi importante porque há poucas pesquisas que indicam formas de aproveitar esse subproduto. Esse conhecimento poderá, no futuro, agregar maior valor ao fruto e fortalecer a cadeia de produção”, afirma Praia.

A procura por cervejas diferenciadas é grande. “Existe um mercado promissor de cervejas não convencionais que está se estabelecendo. Além das cervejas Sour, hoje já encontramos cervejas sem glúten, com fermentação em barril, entre outras variedades”, diz Herkenhoff. “Se os benefícios probióticos da cerveja à base de cajá forem confirmados, isso certamente seria um diferencial de produto”, destaca Herkenhoff.

Pesquisas correlacionadas

O grupo ainda estuda outras inovações no mercado das cervejas. Uma delas é o desenvolvimento de novas leveduras não alcoólicas, utilizadas como forma de elaborar cervejas sem álcool que tenham menos diferenças no sabor em relação à cerveja convencional. “As grandes cervejarias já contam com leveduras não alcoólicas, no entanto, boa parte delas precisa ser aprimorada quanto ao sabor. Além disso, ainda não há registros de cerveja probiótica sem álcool e o desenvolvimento dessa levedura é fundamental para isso.”

Outra inovação é o desenvolvimento de probióticos que possam ser aplicados em cervejas convencionais. “Além de conferir ganhos à saúde, essa é uma estratégia que permitirá modular os sabores de uma cerveja, conforme já validamos em estudos anteriores.”

Texto: Assessoria de Comunicação do Forc

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