Mais precisão e menos dor: teste clínico facilita diagnóstico da urticária crônica espontânea

Teste de ativação de basófilos é realizado com amostra de sangue do paciente, sem necessidade de reaplicação na pele; causas da doença ainda são investigadas

 Publicado: 28/11/2024 às 8:00

Texto: Redação*

Arte: Simone Gomes

Pessoa coçando o braço que tem um vergão vermelho

A urticária crônica espontânea é uma condição de pele que causa coceira intensa, inchaços ou “vergões” frequentes e acomete entre 1% e 2% da população mundial  – Foto: Freepik

Cientistas brasileiros estão desenvolvendo uma nova abordagem para ajudar no diagnóstico da urticária crônica espontânea (UCE), doença caracterizada por lesões avermelhadas na pele que causam coceiras intensas e pode persistir de seis semanas por até vários anos. A pesquisa propõe o uso do teste de ativação de basófilos (BAT) em alternativa ao método tradicional de diagnóstico – o teste de soro autólogo – que tem disponibilidade limitada e pode causar desconforto. 

O trabalho é uma parceria do Grupo Fleury com a Divisão de Clínica Dermatológica do Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina (FM) da USP. Atualmente, participam da pesquisa pessoas com diagnóstico clínico de UCE e que recebem acompanhamento médico do Ambulatório de Dermatologia do HC, assim como pessoas que apresentam apenas urticária física e voluntários sadios. 

A urticária crônica espontânea é uma condição de pele que causa coceira intensa, inchaços ou “vergões” frequentes e acomete entre 1% e 2% da população mundial, sendo mais comum entre mulheres de 30 a 50 anos. A doença pode ser causada pela presença de autoanticorpos – anticorpos dirigidos contra o próprio organismo – que estimulam células sanguíneas chamadas basófilos, responsáveis por desencadear reações alérgicas. Esses anticorpos forçam os basófilos a se manterem ativos por longos períodos, dando origem aos sintomas. 

“Não existem ainda na literatura científica marcadores ou exames que possam elucidar as causas específicas relacionadas à urticária crônica espontânea. Exames como teste do soro autólogo, teste de estimulação de basófilos, Elisa para detecção de autoanticorpos contra receptores de alta afinidade para [o anticorpo] IgE têm sido relatados na literatura científica, porém o papel desses exames continua ainda em investigação”, afirmam Celina Maruta e Raquel Orfali, professoras da FMUSP e coordenadoras do Ambulatório Especializado em Urticária do HC, acreditado internacionalmente como Centro de Referência e Excelência em Urticária. De acordo com as pesquisadoras, o intuito desse projeto é disponibilizar meios para melhorar a acurácia no diagnóstico da urticária crônica espontânea. 

No teste de soro autólogo, o soro extraído do sangue do próprio paciente é inoculado em seu braço. Na mesma região da pele são aplicadas substâncias controle para comparação – salina, para controle negativo, e histamina, para positivo. Quando se formam pápulas – pequenas lesões sólidas e elevadas na pele – é possível que estejam presentes anticorpos da classe IgE (imunoglobulina E) , associados a doenças atópicas e alergias. 

 Já no novo teste, basófilos de doadores saudáveis são expostos ao soro dos pacientes com suspeita de UCE. “Se o soro tiver anticorpos que ativam os basófilos, essas células começam a expressar em sua superfície uma proteína chamada CD63, que pode ser medida para avaliar o nível de ativação”, explica Maira Pedreschi Marques Baldassin, doutora em Imunologia Clínica e Alergia pela USP e analista de pesquisa e desenvolvimento do Grupo Fleury.  

Essa nova técnica pode oferecer uma forma mais confortável e eficiente de diagnosticar a urticária crônica espontânea, ajudando médicos a entenderem melhor a condição e a oferecerem tratamentos mais adequados.  

“O teste do soro autólogo [método tradicional de diagnóstico] é um teste realizado com o soro do paciente com UCE e apresenta algumas desvantagens, como o tempo de realização e a presença de resultados falso-positivos. Já o teste de ativação de basófilos é um exame que, apesar de sua complexidade, apresenta menos desconforto para o paciente, podendo ser uma alternativa complementar ao teste do soro autólogo”, explicam Maruta e Orfali.

Foto de um braço tomado por manchas vermelhas sobressalentes
Na urticária crônica espontânea, não há participação de um estímulo externo e a duração do surto é sempre superior a seis semanas - Foto: James Heilman, MD - Wikipedia

Imprecisão e incômodo

A urticária crônica espontânea pode ser decorrente da presença de autoanticorpos em circulação no sangue que reagem contra o anticorpo IgE ou o receptor da IgE em basófilos e mastócitos – células inatas do sistema imunológico. Os autoanticorpos estimulam essas células a liberarem histamina e outros mediadores que resultam no aparecimento de urticas (lesões de autorrelevo), angioedema (inchaço de camadas mais profundas da pele) ou ambos. 

Assim como a UCE, a urticária aguda é caracterizada pelo aparecimento de urticas que se “movem” pelo corpo, podendo surgir em locais distintos do corpo. Porém, o surto de urticas tem duração inferior a seis semanas. As principais causas relacionadas com a urticária aguda são alimentos, medicamentos, infecções e picadas de insetos. Já na UCE, não há participação de um estímulo externo e a duração do surto é sempre superior a seis semanas.  

O tratamento da UCE visa ao controle completo da doença, considerando a segurança e a qualidade de vida de cada paciente individualmente. “A primeira linha de tratamento envolve o uso de anti-histamínicos não sedantes [antialérgicos] e, quando não há resposta, podem ser administrados medicamentos imunossupressores. Em casos mais refratários são utilizadas medicações imunobiológicas como as que visam à eliminação de linfócitos B produtores de anticorpos ou o bloqueio do anticorpo IgE ou de algumas citocinas (por exemplo, o TNF-α ou o receptor de IL-4/IL-13), sempre sob supervisão de médicos alergistas ou dermatologistas”, explica Luis Eduardo Coelho Andrade, chefe do Laboratório de Imuno-Reumatologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e assessor médico da área de Imunologia do Grupo Fleury. 

*Com informações da Assessoria de Comunicação do Grupo Fleury, adaptado por Tabita Said


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.