Fotos: PxHere e Wikimedia Commons

Genes de linhagem brasileira podem aumentar resistência de bactéria que infecta bovinos

A Salmonella enterica da variedade Dublin provoca diarreia e infecções graves, comprometendo produção de leite e sobrevivência dos animais, além de poder ser transmitida aos humanos

 19/07/2022 - Publicado há 2 anos

Texto: Júlio Bernardes

Arte: Rebeca Fonseca

Na Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP) da USP, pesquisadores realizaram a análise de genes de virulência e resistência a medicamentos antimicrobianos em linhagens brasileiras da bactéria Salmonella enterica da variedade Dublin, em comparação com variedades isoladas de outros locais do mundo. A pesquisa descobriu que as linhagens do Brasil pertencem a dois grupos genéticos específicos e possuem genes únicos que podem conferir maior virulência à bactéria, que provoca diarreia e infecções graves em bovinos, comprometendo a produção de leite e a sobrevivência dos animais.

A pesquisa é descrita no artigo Whole genome sequencing analyses revealed that Salmonella enterica serovar Dublin strains from Brazil belonged to two predominant clades, publicado na revista Scientic Reports, do grupo Nature, em 22 de junho. Os resultados ajudarão na melhor caracterização da bactéria e, no futuro, podem colaborar na pesquisa de vacinas e na escolha de antibióticos para prevenir e tratar os animais, reduzindo as chances de contágio para humanos, nos quais também causa infecção grave.

“A Salmonella Dublin é primariamente uma causadora de doenças em bovinos, geralmente provocando diarreia em animais mais jovens e infecção gástrica, intestinal e sistêmica nos mais velhos, levando a anorexia, aborto, redução na produção de leite e podendo chegar à morte”, relata, ao Jornal da USP, o pesquisador Fábio Campioni, primeiro autor do artigo. “A bactéria é liberada através das fezes e do leite e, assim, infecta outros animais e também os seres humanos, no quais, em geral, ela causa doença invasiva gastrointestinal grave, diferente de outras Salmonellas, que costumam apenas levar à diarreia.”

“Não temos dados da incidência de S. Dublin no Brasil. Em geral, essa bactéria não está entre as variedades de Salmonella mais isoladas de humanos”, aponta o pesquisador. “Porém, quando ela é identificada, geralmente é em casos de infecções invasivas, que caracterizam‐se pelo isolamento da bactéria em fluidos corporais e tende a culminar em um quadro clínico de infecção mais grave, seja no estômago ou no intestino.”

Resistência

Durante a pesquisa foi realizada uma análise genética com dados de sequenciamento de genoma completo de linhagens de S. Dublin isoladas no Brasil entre si e em comparação com as de outros locais do mundo. “Além disso, analisamos comparativamente a presença de genes de virulência e de resistência a antimicrobianos nessas linhagens”, afirma Campioni. “Os resultados da análise do genoma completo apresentaram as linhagens separadas em três diferentes grupos, e as do Brasil foram alocadas em dois deles.”

“A maioria dos genes e regiões genômicas relacionadas à virulência variaram entre as linhagens estudadas. Porém, alguns genes relacionados a sideróforos, que são captadores de ferro, estiveram presentes somente nas do Brasil”, destaca o pesquisador. Os sideróforos são produzidos pelas bactérias para obter ferro do corpo do hospedeiro. “Além disso, 11 plasmídios diferentes foram encontrados em linhagens brasileiras, que também apresentaram poucos genes de resistência a antimicrobianos em comparação com as isoladas em outros locais do mundo.” Os plasmídios são pequenos DNAs que podem carregar genes de virulência e de resistência a drogas, podendo conferir vantagens para a sobrevivência da bactéria no meio em que vive.

De acordo com Campioni, a melhor caracterização de linhagens de S. Dublin isoladas em um período de mais de 30 anos no Brasil ajuda a elucidar a evolução e o repertório genético de genes de virulência e resistência a antimicrobianos.

“Dessa forma, o trabalho contribui com futuros estudos que podem vir a desenvolver vacinas e também ajuda na escolha da melhor terapia com antibióticos para o tratamento desses animais, consequentemente, reduzindo sua transmissão para humanos”, conclui.

Supervisionado pela professora Juliana Pfrimer Falcão, da FCFRP, o trabalho teve também a participação de pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Rio de Janeiro, do Instituto Adolfo Lutz, de São Paulo e da Food and Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos.

Fábio Campioni - Foto: Reprodução

Mais informações: e-mail fabiocampioni@yahoo.com, com Fábio Campioni, e jufalcao@fcfrp.usp.br, com a professora Juliana Pfrimer Falcão

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