Estudo identifica proteína que ajuda alga ancestral a “nadar”

A septina está relacionada à estruturação do flagelo, responsável pela movimentação da alga “Chlamydomona reinhardtii”

 16/08/2018 - Publicado há 6 anos     Atualizado: 19/08/2018 as 14:17
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Nos organismos superiores, principalmente humanos, em que a proteína septina já foi muito estudada, foram encontradas relações dela com determinados tipos de câncer e com o Alzheimer – daí o grande interesse em saber como ela funciona em outros seres vivos. Na imagem, algas Chlamydomona – Foto: Dartmouth College via Wikimedia Commons – Domínio Público

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A vida no planeta é algo bem complexo – e se formos entrar no nível de detalhes em que cientistas da pesquisa básica atuam, o quebra-cabeças se complica. Mas é peça por peça que eles vão elucidando como as coisas funcionam nos diferentes reinos. Pesquisadores da USP, por exemplo, buscaram entender qual função de uma proteína em uma alga ancestral, a
Chlamydomona reinhardtii. E então descobriram que a proteína, chamada septina, está ligada à formação do flagelo. Quando você vê imagens de espermatozoides “nadando” rumo ao óvulo, flagelo é aquela cauda que ele bate para se movimentar. O espermatozoide é uma célula dentro de um organismo humano com bilhões de outras. Mas existem seres bem antigos, como essa alga, que são constituídos de uma célula só, e também apresentam flagelos que lhes permitem sair passeando por aí.

Agora a questão é elucidar por que essa proteína foi mantida na evolução dos organismos primitivos até os superiores, como os do reino animal e vegetal. Você deve estar se perguntando por que isso importa. “Nos organismos superiores, principalmente humanos, em que a septina é muito estudada, já foram encontradas relações dela com determinados tipos de câncer e com o Alzheimer, por exemplo. Então, conhecer sua função poderá, num futuro próximo, ajudar a elucidar por quais mecanismos essa proteína está participando de algumas doenças e como podemos impedir isso, em busca da cura ou prevenção”, esclarece Heloisa Ciol, líder do estudo no Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP.

As proteínas septinas são encontradas em praticamente todos os organismos dos reinos fungi e animalia. Sabe-se que nos humanos estão relacionadas a divisão e estrutura celular. O que os estudos buscam definir agora é alguma correlação das funções da proteína em organismos ancestrais e nos superiores. Ainda não foi possível fazer essa conexão. Segundo a pesquisadora Heloisa Ciol, serão necessárias a utilização de uma microscopia e explorações ainda mais profundas.

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As ferramentas: física aplicada

Para descobrir as funções de septina na alga, foram utilizadas quatro frentes de pesquisa: duplo-híbrido, microscopia confocal, RNA de interferência e análise de expressão gênica.

O sistema duplo-híbrido é comumente utilizado na biologia para estudar interações entre proteínas e a interação entre proteína e DNA. Para resumir, ao descobrir proteínas “parceiras” da septina, foi possível inferir suas funções na alga.

A microscopia confocal aumenta o contraste da imagem microscópica, construindo imagens tridimensionais com uma melhor definição. A técnica auxiliou a localizar a proteína na alga, o que também ajudou a deduzir o papel da septina na Chlamydomona.

Localizações pontuais por toda a célula da alga durante a fase de divisão celular sugerem que a septina também desempenha um importante papel na manutenção da estrutura para a conclusão da divisão celular – Foto: Dartmouth College Electron Microscope Facility

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Já pela técnica chamada
RNA de interferência é possível observar como o organismo lida com a falta da proteína. Na pesquisa, ela foi utilizada para bloquear ou diminuir a quantidade de expressão de septina na célula. “Nós queríamos observar se haveria alguma alteração no crescimento, na divisão ou na morfologia (forma) celular com a ausência de septina. Notamos uma morfologia diferente nas células que conseguimos transformar, o que pode estar relacionado à falta de septina.” Com isso, os pesquisadores deduziram que a septina também auxilia na estruturação celular da alga.

Por fim, a análise de expressão gênica verifica a variação da expressão dos genes no organismo. Como a alga é um organismo fotossintético, é possível controlar o seu ciclo de vida através da luz. Expondo a alga a 12 horas de luz e, em seguida, a 12 horas de escuro, sabe-se que nesse período a célula vai se dividir e completar um ciclo de vida completo. Ou seja, as células nascem, em seguida há o preparo para entrar em divisão, depois da divisão são geradas células-filhas e essas células-filhas entram nesse mesmo ciclo de crescimento. Assim, pode-se observar que algumas proteínas são mais expressas durante a fase do claro, quando a célula está fazendo fotossíntese, ou durante a fase do escuro, quando ocorre a respiração celular. A técnica deu pistas sobre mais uma função da proteína, mas a pesquisadora ressalta que ainda serão necessários mais estudos a respeito. “Nós observamos que há um ciclo de expressão próximo ao período de divisão celular da célula. Com isso, acreditamos que a septina tenha uma participação não só na estrutura do flagelo e da alga, mas talvez na fase de divisão celular deste organismo.”

A tese de doutorado resultante da pesquisa de Heloísa Ciol no IFSC, com orientação de Ana Paula Ulian Araujo, está disponível neste link.

Mais informações: e-mail helociol@gmail.com, com Heloísa Ciol


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