Direito passou por mudanças, mas se manteve conectado às instituições do País

Pesquisadora da Faculdade de Direito mostra como caminhou o pensamento jurídico no período pré e pós-ditadura

 12/11/2018 - Publicado há 5 anos
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A pesquisa teve como principal objetivo analisar o processo de modernização do pensamento jurídico ao longo do século 20 – Foto: Pixabay

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No período que vai da década de 1930 até a redemocratização, o pensamento jurídico brasileiro passou por diversas mudanças, que se conectaram com as modificações institucionais do País. “Num primeiro momento, o pensamento era voltado à construção de uma nação e a críticas à ciência do direito formalista”, descreve a advogada Luciana Silva Reis. “Num segundo momento, no período pós-1964, surgiu a necessidade de se compreender o que era o direito legítimo”, descreve a pesquisadora, que é autora da tese A Modernização Crítica do Pensamento Jurídico Brasileiro no Século 20 – Ciência do direito, ensino e pesquisa.

A pesquisa defendida na Faculdade de Direito (FD) da USP, sob orientação do professor José Eduardo Faria, teve como principal objetivo analisar o processo de modernização do pensamento jurídico brasileiro ao longo do século 20. Segundo Luciana, uma das características observadas em seu estudo é que, entre a década de 1930 e o regime militar, boa parte dos juristas eram políticos profissionais que “ensinavam o direito”. Segundo a pesquisadora, foi o momento em que o pensamento jurídico estava voltado à construção da nação. “Eram os ideólogos do Estado Novo”, pontua Luciana. O regime, instaurado por Getúlio Vargas e que durou entre 1937 e 1946, foi caracterizado pela centralização do poder, nacionalismo, anticomunismo e por seu autoritarismo.
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Luciana Silva Reis, advogada e autora da tese A Modernização Crítica do Pensamento Jurídico Brasileiro no Século 20 – Ciência do direito, ensino e pesquisa – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

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“Na opinião desses legisladores, o direito deveria refletir a nossa realidade, brasileira, e era o Estado quem deveria operar essas mudanças”, cita a pesquisadora, destacando Oliveira Viana (Francisco José de Oliveira Viana) como um dos autores expressivos desse pensamento. Ele foi um dos responsáveis pela elaboração da nova legislação trabalhista da década de 1930.

Mas, ao lado destes juristas, havia os que, apesar de concordarem com a crítica de que nosso direito não refletia a realidade brasileira, tinham tendências democráticas. Dentre estes, um nome importante foi Hermes Lima, que lecionou na Faculdade de Direito do Largo São Francisco da USP em 1926 e, posteriormente, foi ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) entre 1963 e 1969, sendo afastado pelo AI-5. “Ele defendeu a renovação do pensamento jurídico e que os professores de direito precisavam enxergar a matéria de outra forma, sem se fiar numa atuação autoritária do Estado. Tratava-se de um grupo preocupado com a democracia, mas que não encontrou espaço por estar numa época autoritária”, conta a pesquisadora.

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Espaço universitário

Com a consolidação do “espaço universitário”, já na década de 1950, os juristas passaram de políticos a professores. “Passou a se falar muito em crise no ensino jurídico, em como o direito era mal ensinado nas faculdades”, destaca a pesquisadora. San Tiago Dantas (Francisco Clementino de San Tiago Dantas) é destacado por Luciana como um dos representantes expressivos desta época. “Ele se via, antes de tudo, como um professor!”, ressalta, lembrando que, “enquanto num primeiro momento a preocupação dos juristas era com a construção da nação, no segundo era necessário pensar sobre a legitimação do direito no período da ditadura”.

Já na década de 1970, com a consolidação dos programas de pós-graduação, abre-se um espaço mais sólido, como mostra o estudo. “Surge então a ‘sociologia jurídica’, que aglutinou as preocupações com o direito legítimo”, descreve Luciana. E isso, segundo ela, novamente coloca a preocupação de que a ciência do direito se aproxime mais da realidade. “Há diversos autores que tiveram sucesso em diversificar o campo da pesquisa jurídica no País, mas a questão ‘conceitual’ ainda permanece em aberto: o que é de fato o direito legítimo”, diz. A Sociologia Jurídica foi definitivamente implantada nos cursos de direito no ano de 1994. De acordo com a pesquisadora, essa introdução foi positiva, pois “incentivou mais pesquisas sobre a realidade do direito com mais estudos empíricos”.

Mais informações: lucianasilvareis@gmail.com


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