Decisões do Judiciário influenciam atuação de parlamentares

Pesquisa mostra que as reformas políticas e eleitorais promovidas pelo Judiciário favoreceram a criação de mais emendas de interesse popular pelo Legislativo

 15/02/2021 - Publicado há 3 anos

 

Pesquisa da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas analisou as mudanças políticas e eleitorais provocadas por decisões judiciais e as reações do Poder Legislativo em função dessas mudanças. Foto: Mauricio Medeiros – Flickr

 

Os impactos de reformas políticas realizadas pelo Poder Judiciário no Brasil nos últimos anos foi tema de pesquisa realizada pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da FFLCH. O cientista político Ricardo Teixeira da Silva avaliou, em sua dissertação de mestrado Impactos da reforma política promovida pelo Poder Judiciário: um estudo sobre a efetividade das mudanças operadas nas regras políticas e eleitorais, as mudanças políticas e eleitorais provocadas por decisões judiciais e as reações do Poder Legislativo em função dessas mudanças.

A pesquisa partiu da hipótese que as intenções dos juízes em suas decisões não produziam resultados concretos. “Aparentemente as reformas promovidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não davam muito certo. Quem estudava o assunto ficava com a impressão de que o Judiciário interferia na competição política com argumentos de senso comum, sem nenhum embasamento científico”, avalia. O trabalho foi orientado pelo professor Rogério Bastos Arantes.

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O maior protagonismo do Judiciário é um fenômeno mundial e vem ocorrendo no Brasil há algumas décadas, principalmente após a Constituição de 1988, que criou novos mecanismos para que a sociedade pudesse levar suas demandas aos tribunais.

Esse novo desenho institucional tornou o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) muito mais permeáveis à argumentação política. “O STF recebeu uma série de novas atribuições e prerrogativas, expandindo a sua atuação para áreas que anteriormente eram exclusivas dos poderes Legislativo e Executivo.”

De acordo com Silva, os tribunais passaram a se dedicar cada vez mais a processos relacionados ao controle da corrupção na política, dando respostas à sociedade que clamava por melhorias no sistema político e eleitoral que não prosperavam no Congresso Nacional.

O trabalho avaliou acórdãos do STF e do TSE em dois casos de reformas políticas promovidas pelo Judiciário: a redução do número de vereadores e a criação da regra de fidelidade partidária. No primeiro, o pesquisador acompanhou a evolução de despesas do Legislativo em 1.843 municípios e constatou a correlação entre número de vereadores e despesas da Câmara Municipal. No segundo caso, verificou o padrão de migrações partidárias ao longo de quatro legislaturas na Câmara dos Deputados, buscando entender o quanto a intervenção judicial alterou o comportamento dos parlamentares.

O Supremo Tribunal Federal (STF) – Foto: Rosinei Coutinho / SCO / STF via Agência Brasil

 

“As duas reformas estudadas na pesquisa impuseram limitações para a classe política. Porém, essas limitações eram vistas com bons olhos pela sociedade. A opinião pública passou a associar os reiterados escândalos de corrupção e má utilização de recursos públicos com supostas deficiências do sistema eleitoral e político. Assim, para a população, os juízes estavam certos em corrigir tais problemas”, explica.

A pesquisa mostrou que as mudanças afetavam diretamente as expectativas de continuidade das carreiras políticas de parlamentares que, ao mesmo tempo, sabiam que as decisões judiciais estavam em sintonia com as aspirações populares. “A solução encontrada pelos parlamentares foi aprovar mudanças que atendiam aos interesses deles e, ao mesmo tempo, prestigiavam o ponto de vista dos juízes e da opinião pública. Isto é, soluções conciliatórias.”

No caso dos vereadores, houve um teto mais rigoroso de gastos pelas câmaras municipais acompanhado de um aumento do número de vagas. No caso da fidelidade partidária, foi aprovada a proibição de troca, mas com uma janela de troca seis meses antes da eleição.

Para o pesquisador, a atuação do Judiciário trouxe para o centro da discussão questões caras à opinião pública, que não prosperavam no Congresso Nacional. “O Legislativo, quando provocado por um ator externo, teve que ouvir com mais atenção aos argumentos que ocupavam o debate público e acabou cedendo em alguns pontos. Como diz o ditado, entregou os anéis para preservar os dedos”. Silva acredita que o trabalho mostra como a interação entre os poderes Judiciário e Legislativo pode contribuir para o aperfeiçoamento de regras institucionais.

Da Assessoria de Comunicação da FFLCH

Mais informações: e-mail comunicacaofflch@usp.br, na Assessoria de Comunicação da FFLCH


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