Cientistas analisam ancestralidade genética da população paulistana

População é heterogênea – composta de diferentes grupos étnicos – e também miscigenada, com diferentes grupos se expressando em cada pessoa individualmente

 Publicado: 30/01/2025 às 8:10     Atualizado: 05/02/2025 às 8:01

Texto: Beatriz La Corte*
Arte: Diego Facundini**

Estudo fez investigações individuais, indicando casos de múltipla ancestralidade - Fotomontagem Jornal da USP com imagens de: Wikimedia Commons/CC BY 3.0; PantheraLeo1359531/Wikimedia Commons/CC0 1.0

Um estudo do Instituto de Biociências (IB) utilizou uma calculadora científica para investigar a ancestralidade média da população de São Paulo. A publicação apontou uma ancestralidade global média 77,5% europeia, 10,4% africana, 7,4% nativa americano, 4,1% leste asiática, 0,5% sul asiática e 0,1% oceânica. Já a análise por grupos populacionais apontou predominância basca/ibéria (entre 33,9% e 37,9%), albânia/itália/sardenha (entre 22,3% e 26,7%) e do oeste europeu (entre 6,2% e 7,2%). 

Apesar da análise ser focada na ancestralidade coletiva, o estudo também fez investigações individuais. Nestes casos, havia presença de múltipla ancestralidade, o que indica um perfil miscigenado da população. As miscigenações mais comuns na amostra são entre europeus, africanos, ameríndios e leste-asiáticos.

Em entrevista ao Jornal da USP, o pesquisador Raphael Amemiya afirmou: “ a população paulistana não é apenas heterogênea [composta por diferentes grupos étnicos, que podem ou não ser isolados um do outro], mas também miscigenada, ou seja, diferentes grupos populacionais podem se expressar no gene de uma só pessoa”. Os Estados Unidos e a Índia são exemplos de países heterogêneos, mas menos miscigenados. 

Homem claro, de cabelos e barba escuros, usando camisa de cor cinza

Raphael Amemiya - Foto: Arquivo pessoal

Grupos populacionaisAncestralidade média
Basca/Ibéria 33,9% - 37,9%
Albânia/Itália/Sardenha 22,3% - 26,7%
Oeste da Europa 6,2% - 7,2%
Esan/Yorubá 5,4% - 7,2%
Karitiana/Suruí/Wichí 3,7% - 4,5%
Oriente Médio/Norte da África 3% - 3,8%
Japão2,9% - 3,7%

Mais dados populacionais

Os estudos de ancestralidade apresentaram avanços nas últimas décadas. Ferramentas de Inteligência Artificial e Machine Learning, como a calculadora utilizada neste estudo, estão cada vez mais autônomas do pesquisador. Uma tendência de estudos é a aproximação da área com outros campos do conhecimento, como a arqueologia e a história. Algumas pesquisas traçam rotas históricas de migração, o que aproxima informações genéticas a achados arqueológicos.

Apesar do progresso recente, esses estudos são uma área em processo de refinamento e ainda percorrem diferentes desafios, como a sub-representação de populações (especialmente de povos nativos, latinoamericanos e africanos) em bancos de dados genéticos. O pesquisador aponta que inferir misturas muito antigas e complexas também é um grande desafio para os cientistas da área.

“A ideia era fazer uma calculadora de fácil uso, com linguagem de programação simples – como o Python – mas que captasse a complexidade dessas amostras foi desafiador”, destaca Miyama.

gráfico com inúmeros pontos coloridos indicando grupos populacionais

A frequência alélica identificada por “Genera” é a amostra da população paulistana disponibilizada pelo laboratório. A aproximação desses elementos com os outros grupos demonstra uma provável ascendência e casos de miscigenação - Imagem: reprodução do artigo

Relevância da análise

Os testes genéticos de ancestralidade, além de serem úteis para a pessoa conhecer mais sobre si mesma, também são úteis na área da saúde. Estudos apontam que certos fatores genéticos variações genéticas associados a doenças apresentam frequências variadas em diferentes grupos populacionais. Variantes associadas à diabetes tipo 2, hipertensão, insuficiência renal e câncer de próstata são exemplos.

"Se testes de riscos genéticos forem estabelecidos clinicamente, saber a ancestralidade é importante para uma interpretação mais acurada de risco”

O artigo também chama atenção para o fato de que grande parte dos estudos genéticos são feitos em populações europeias e, por isso, a patogenicidade (capacidade de um agente biológico causar doença) de algumas variantes não é totalmente compreendida em pessoas de fora do continente. O reconhecimento da ancestralidade paulistana direciona os cientistas para a produção de novos estudos e interpretações.

O artigo “Análise da ancestralidade genética da população de São Paulo” está disponível on-line e pode ser lido aqui.

Mais informações: raphael.amemiya@usp.br

*Estagiária com orientação de Luiza Caires
**Estagiário com orientação de Moisés Dorado

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