Pesquisadoras discutem presença de minorias no “The Voice Brasil”

Em artigo, autoras indagam se a televisão poderia proporcionar visibilidade a sujeitos anônimos nos reality shows como esse

 16/04/2018 - Publicado há 6 anos     Atualizado: 21/08/2018 as 16:58

Público – Foto: Pixabay/CCO

Artigo da revista Novos Olhares discute a presença constante, hoje, da diversidade em programas musicais com “formatos audiovisuais híbridos”, no sentido de investigar diferentes possibilidades de atuação, na sociedade, dos diferentes sujeitos. Quando se referem a “híbridos”, as autoras Rosana Soares e Andrea Limberto querem dizer produções culturais “que se apresentam como mistura entre dois ou mais gêneros (ou formatos) conhecidos”, algo cada vez mais frequente no cenário das mídias contemporâneas, em narrativas que oscilam entre elementos da realidade e da ficção.

Para tratar destes aspectos, o texto analisa características do reality show The Voice Brasil, mais especificamente a temporada exibida em 2014. Versão brasileira do original holandês, o programa tem o intuito de descobrir novos talentos no campo da música. Na primeira fase, os jurados apenas escutam os candidatos e os escolhem pela voz. A partir daí, formam-se equipes compostas pelos escolhidos de cada jurado ou técnico. Cada um deles orienta sua equipe de cantores, que disputam entre si um lugar na final, quando  o vencedor é escolhido pelo público.

Programa se insere dentro de um modelo em que a televisão atua como “representativa do popular midiático”, proporcionando visibilidade a anônimos e minorias – Foto: Pixabay/CCO

Para Rosana Soares e Andrea Limberto, programas como o The Voice Brasil se constituem como espaços de presença/ausência de sujeitos que, normalmente, não aparecem em programas televisivos. Mas será que os participantes estão verdadeiramente representados em sua identidade nesse tipo de programa?

Nessa reflexão, as autoras partem da identificação da diversidade nos reality shows, da “visibilidade por eles propostas, nos termos de uma televisão que apela a certo tipo de realismo visando alcançar o reconhecimento por parte de seu público”. Os candidatos mais bem-sucedidos revelam histórias de superação e posturas polêmicas, o que pode gerar identificação em uma parcela dos espectadores.

A diversidade comporta a heterogeneidade, a transgressão praticada por aqueles que “podemos considerar, de algum modo, como culturalmente estigmatizados”. Se, por um lado, valoriza-se o protagonismo de pessoas comuns – “que não apenas performatizam um enredo construído pelo programa mas nele inscrevem sua própria trajetória” – , por outro questiona-se se a diferença pode ser, “de fato contemplada e acolhida”. Ou seja:

Trata-se de um modo de construção menos estigmatizado, passível de causar novos sentidos? Ou, ao contrário, a caracterização desses personagens como “pessoas comuns” os mantém em seus lugares usuais, como em antigos programas humorísticos, de auditório, vespertinos ou sensacionalistas?

Realities shows como o The Voice são veiculados também por conseguirem “acionar valores locais em formatos que favorecem a exportação global de modelos” – Foto:Pixabay/CCO

Para as autoras, esse gênero de programa antigo, mas que mantém sua atualidade e sucesso, parece ter sim o potencial de se tornar um canal de expressão, de comunicação dos sujeitos, por intermédio do canto – a voz de quem até então ficou calado. Isso porque, se por um lado os candidatos nutrem a ” indústria midiática”, por outro, o programa também retira sujeitos que vivem à margem e os traz “ao centro da cena, instaurando vozes dissonantes e, em alguns casos, a possibilidade de serem efetivamente ouvidas”.

Finalizando, as autoras salientam a urgência de iniciativas que valorizem a visibilidade da diversidade, seja nas práticas do cotidiano, seja no espaço das mídias, “transformando a visibilidade em política efetiva de participação e reconstrução coletiva”.

Rosana de Lima Soares é professora livre-docente no Departamento de Jornalismo e Editoração e no Programa de Pós-Graduação em Meios e Processos Audiovisuais da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, atua, hoje, como pesquisadora do MidiAto – Grupo de Estudos de Linguagem: Práticas Midiáticas.

Andrea Limberto é mestre e doutora em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, atua como pesquisadora do MidiAto – Grupo de Estudos de Linguagem: Práticas Midiáticas.

SOARES, Rosana de Lima; LIMBERTO, Andrea. Hibridismo como forma televisiva impura: vozes dissonantes em The Voice Brasil. Novos Olhares, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 7-21, dez. 2017. ISSN: 2238-7714. DOI: http://dx.doi.org/10.11606/issn.2238-7714.no.2017.140389. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/novosolhares/article/view/140389>. Acesso em: 19 fev. 2018.

Margareth Artur / Portal de Revistas da USP


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