Inteligência artificial facilita a criação de novos tipos de vidros

Técnica prevê temperatura em que mistura de elementos químicos se transformará em material vítreo

 10/10/2018 - Publicado há 6 anos
Os cientistas criaram uma ferramenta que prevê o que vai acontecer quando vários elementos químicos são misturados, bem como identifica o intervalo de temperatura em que essa composição passará por processos que gerarão um novo material vítreo (transformação vítrea) – Foto: Divulgação / CEPID – CeMEAI via Facebook

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Pesquisa com a participação do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos, empregou uma técnica de inteligência artificial, as redes neurais artificiais, para poder facilitar a criação de novos tipos de vidros inorgânicos não metálicos. Os cientistas criaram uma ferramenta que prevê o que vai acontecer quando vários elementos químicos são misturados, bem como identifica o intervalo de temperatura em que essa composição passará por processos que gerarão um novo material vítreo (transformação vítrea).

O estudo foi realizado pelo professor Edgar Dutra Zanotto, do Departamento de Engenharia de Materiais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar); André de Carvalho, professor e vice-diretor do ICMC da USP; e Daniel Roberto Cassar, pós-doutorando do Laboratório de Materiais Vítreos da UFSCar.

O professor Edgar Zanotto e o pós-doutorando Daniel Cassar, da Universidade Federal de São Carlos, estabeleceram parceria com o professor André de Carvalho, do ICMC/USP – Foto: Mariana Pezzo / CCS-UFSCar

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Os primeiros resultados do estudo são apresentados no artigo Predicting glass transition temperatures using neural networks, publicado na última edição de uma das principais revistas da área de Engenharia de Materiais, a Acta Materialia. As redes neurais artificiais são técnicas computacionais que apresentam um modelo matemático inspirado na estrutura neural de organismos inteligentes, os quais adquirem conhecimento por meio da experiência. Por isso, os especialistas da área de computação precisam inserir vários dados nessas redes e treiná-las para que possam realizar a tarefa que é esperada.

Os vidros podem ser obtidos a partir de composições incluindo quase todos os elementos químicos da tabela periódica, que geralmente passam por um processo de aquecimento e fusão e, depois, de resfriamento rápido. Como há uma vasta possibilidade de fazer diferentes composições químicas, os materiais vítreos que surgem desses processos também possuem uma grande variação em suas propriedades mecânicas, óticas, térmicas, elétricas e químicas. É por isso que os vidros podem ser utilizados em inúmeras aplicações.

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Composições

Os especialistas estimam que existam 10 elevado a 52 composições vítreas possíveis e, até hoje, apenas 10 elevado a 5 vidros foram, de fato, produzidos nos laboratórios e indústrias de todo o mundo. Esses números dão a dimensão do quanto ainda precisa ser pesquisado. “Do jeito que fazemos hoje, que apelidamos de ‘mix and get lucky‘ – misturar e ter a sorte de encontrar uma composição com novas propriedades –, é impossível chegar até 10 elevado a 52, mesmo se todos os habitantes da Terra fizerem um vidro diferente todos os dias durante milhares de séculos”, explica Zanotto, diretor do Centro de Pesquisa, Tecnologia e Educação em Materiais Vítreos (CeRTEV), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) apoiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Há dois anos o pesquisador começou a pensar em utilizar ferramentas computacionais da área de inteligência artificial, incluindo redes neurais artificiais, para facilitar a busca por desenvolver novos materiais vítreos. A partir de uma conversa com o pós-doutorando Daniel Roberto Cassar, do Laboratório de Materiais Vítreos (LaMaV) – também coordenado por Zanotto e parte do CeRTeV –, que tinha interesse por inteligência artificial e fez um curso sobre o tema, Zanotto começou a escrever um manuscrito em conjunto, mas havia várias dúvidas e eles resolveram buscar a ajuda dos especialistas no assunto. Então, há um ano, juntou-se ao time o professor André de Carvalho, que também é membro de um Cepid, o Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria (CeMEAI), sediado no ICMC.

Com a parceria, pesquisadores conseguiram construir uma rede neural para prever a temperatura de transição vítrea de diferentes composições. Ou seja, essa ferramenta de inteligência artificial faz uma previsão do que vai acontecer quando vários elementos químicos são misturados bem como identifica o intervalo de temperatura em que essa composição passará por processos de transformação que gerarão um novo material vítreo. “Mesmo os profissionais mais experientes só conseguem estimar propriedades para misturas com até cinco ou seis elementos. Com mais componentes, eles interagem e as estimativas tornam-se muito complexas”, diz Zanotto.

“Com essas redes inteligentes, poderemos desenvolver vidros sequer imaginados, com propriedades e aplicações exóticas. Vidros contendo até 10 elementos são relativamente comuns, mas há um universo a ser explorado: composições com 15 a 80 elementos, inacessíveis empiricamente. Trata-se de uma transformação radical”, destaca o professor. A pesquisa utilizou 55 mil composições – obtidas em bases de dados com registros depositados durante mais de 50 anos – para treinar a rede neural. “Essas redes precisam de muitos dados de boa qualidade para aprender corretamente. Quanto mais dados, mais capacidade de generalização, e este foi outro grande esforço que precisamos fazer: extrair todos esses dados, treinar e validar a rede com eles”, explica o diretor do CeRTEv.

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Produto

Hoje, o pioneiro Daniel Cassar já não é mais o único pesquisador a trabalhar com as redes neurais no grupo coordenado por Zanotto. Dois anos após a conversa inicial, já há um trabalho de conclusão de curso finalizado e outro em andamento, uma pesquisa de mestrado em andamento e um segundo pesquisador de pós-doutorado. Além disso, sob a orientação do professor André de Carvalho, no ICMC, estão sendo realizadas mais duas pesquisas de doutorado e outras duas de pós-doutorado.

No ICMC, o professor André de Carvalho está orientando mais duas pesquisas de doutorado e outras duas de pós-doutorado relacionadas a aplicações de inteligência artificial na área de materiais vítreos – Foto: Reinaldo Mizutani

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“Para nós, a rede é um produto, uma ferramenta para as nossas pesquisas em engenharia de materiais. Para o grupo do André, elas são o objeto de pesquisa, e eles já estão, por exemplo, estudando qual o melhor algoritmo para resolver um mesmo problema”, conta Zanotto. “Já temos algumas redes treinadas, envolvendo diferentes propriedades de vidros, e uma pesquisa que é anterior às próprias redes, relacionada ao tratamento dos dados para que não sejam inseridos registros com erro no treinamento da rede. É espetacular o avanço em pouco mais de um ano. Estamos animados, cada nova propriedade, cada pesquisa abre um novo horizonte, é um tema infinitamente amplo, moderno e relevante”, avalia.

As atividades desenvolvidas também envolvem a frente da inovação, com a construção de softwares que permitam o uso das redes desenvolvidas por outros grupos na academia e na indústria. A partir da primeira rede desenvolvida por Cassar, o primeiro programa já está em desenvolvimento, em uma parceria com a empresa júnior de Computação da UFSCar (CATI Jr.). Nele, será possível inserir uma determinada composição química inorgânica, não metálica, e prever a sua temperatura de transição vítrea. “Esta é uma aplicação com interesse principalmente científico. Mas, no futuro, quando unirmos as redes relacionadas às diferentes propriedades, poderemos ter a aplicação inversa, com uma relevância muito grande para a indústria. Com essas redes inversas, será possível dizer ao software quais propriedades são desejadas, e ele sugerirá algumas composições com maior probabilidade de apresentar essas propriedades”, finaliza Zanotto.

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(Com informações da Assessoria de Comunicação do ICMC e da Coordenadoria de Comunicação Social da UFSCar)

Mais informações: (16) 3373-9666; e-mail comunica@icmc.usp.br, na Assessoria de Comunicação do ICMC


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