Pesquisadores desvendam mecanismo da dor aguda no herpes zoster

Descoberta aponta novo alvo para o tratamento, que pode usar substâncias já existentes no mercado

 19/06/2017 - Publicado há 7 anos     Atualizado: 24/04/2018 as 10:56
Bolhas de herpes zoster no pescoço e ombros – Foto: via John Pozniak / Wikimedia Commons / CC BY-SA 3.0

Pessoas que desenvolveram herpes zoster e sofrem com um quadro de dores agudas ganharam um aliado no tratamento dessa doença. Pesquisadores do Centro de Pesquisas em Doenças Inflamatórias (Crid) conseguiram desvendar o mecanismo que gera a dor aguda e que também contribui para o desenvolvimento de dor crônica nesses pacientes. O trabalho foi publicado na revista Journal of Neuroscience no início do mês.

O herpes zoster é uma doença infecciosa causada pelo vírus Varicella zoster, o mesmo que causa a catapora na infância e está presente em 95% das pessoas. Em torno de 96% dos pacientes acometidos pela doença apresentam dor aguda e debilitante, que impede tarefas cotidianas, como tomar banho ou se vestir.

Dados dos Centers for Disease Control and Prevention (CDC), nos Estados Unidos, mostram que uma a cada três pessoas desenvolverá herpes zoster em algum momento da vida. No Brasil, não há dados específicos, mas segundo o Sistema de Informações Hospitalares do SUS, aproximadamente 10 mil pessoas são internadas por ano em virtude de complicações causadas pelo vírus Varicella zoster. Ele fica dormente durante a maior parte da vida do indivíduo e pode ser reativado em pessoas imunossuprimidas, ou seja, cujo sistema imune não funciona corretamente, ou após os 50 anos de idade, quando o organismo fica mais suscetível a quedas na imunidade.

“Quando o vírus infecta o indivíduo, atinge os queratinócitos, que são as células da pele. Por isso, há a formação de lesões características. Em seguida, ele infecta os neurônios sensitivos, também presentes na pele, e segue até encontrar o gânglio da raiz dorsal ou o gânglio trigeminal, no caso do rosto, onde está o corpo celular desses neurônios. É ali que o vírus permanece por anos, em um período de latência, depois que o sistema imune controla a infecção. Se há uma queda no sistema imunológico, ele sofre um processo de reativação e volta a se replicar, a produzir novos vírus, causando uma inflamação no gânglio. Ele faz, então, o caminho inverso: é transportado até a pele e causa as lesões zosteriformes, que também são bolhas. Essa inflamação das células nervosas é responsável por causar a dor intensa”, explica o pesquisador principal do Crid e professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP Thiago Mattar Cunha, um dos autores do trabalho.

O Centro de Pesquisas em Doenças Inflamatórias (Crid) conseguiu desvendar o mecanismo que gera a dor aguda e que também contribui para o desenvolvimento de dor crônica nesses pacientes – Imagem: Adaptado de ContraVir Pharmaceuticals

Para estudar o mecanismo que gera essa dor, os pesquisadores utilizaram modelos de camundongos infectados com o vírus da herpes simples (HSV-1), cujo comportamento é semelhante ao do Varicella zoster no ser humano. “O camundongo não é suscetível ao Varicella zoster, por isso usamos o HSV-1, que é da mesma família. Quando infectamos os camundongos, eles apresentam uma hipersensibilidade dolorosa, pois o vírus chega ao gânglio e promove uma inflamação nesse local. Examinamos vários aspectos dessa inflamação local, como o infiltrado de células, que contém macrófagos e neutrófilos (células de defesa do organismo), e caracterizamos a resposta imune”, conta Cunha.

Ao examinar a produção de mediadores inflamatórios, os pesquisadores observaram a ação de uma molécula específica, o fator de necrose tumoral (TNF). Ele é liberado pelas células do sistema imune e age nos receptores expressos pelas chamadas células gliais satélite, que envolvem o neurônio sensitivo.

Segundo ele, a pesquisa demonstrou que o TNF pode ser usado como um alvo no tratamento da dor herpética. Já existem, inclusive, substâncias no mercado que são usadas para bloqueá-lo.

Embora o controle da inflamação seja fundamental para a redução da dor aguda, cerca de 40% dos pacientes permanecem sentindo dores por até muitos anos. Eles desenvolvem o que os pesquisadores chamam de neuralgia pós-herpética, ou seja, dor crônica. “Não se sabe muito bem a explicação para essa neuralgia pós-herpética. Acreditamos que processos envolvidos na dor aguda levam à cronificação dessa dor. Então, se compreendermos a dor aguda, conseguiremos prevenir a pós-herpética”, diz.

Cunha também indica que existem na literatura casos de pacientes, geralmente portadores de doenças autoimunes, tratados com terapias bloqueadoras do TNF que se tornam menos suscetíveis ao desenvolvimento da dor pós-herpética. “É óbvio que isso necessita de mais estudos clínicos, com uma população maior de pacientes, mas é uma evidência que dá suporte para nossos achados e ainda abre uma perspectiva em longo prazo para casos de dor crônica no herpes zoster.”

Sobre o Crid

O Centro de Pesquisas em Doenças Inflamatórias (Crid) é um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) financiados pela Fapesp e localizados no campus da USP em Ribeirão Preto.

Thais Cardoso / Assessoria de Imprensa do IEA Polo Ribeirão Preto, com edição do Jornal da USP

Mais informações: site http://crid.fmrp.usp.br


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