Catálogo de estrelas da Via Láctea é disponibilizado ao público

O terceiro release de dados, divulgado pela Agência Espacial Europeia (ESA), inclui posições e brilhos de quase 2 bilhões de estrelas. Detalhes sobre as descobertas serão apresentados em uma aula aberta na segunda-feira (7), às 16 horas

 04/12/2020 - Publicado há 3 anos
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GAIA_EDR3: 1,8 bilhão de estrelas observadas pelo Gaia – soma dos fluxos de milhares de estrelas por pixel - Foto: ESA/Gaia/DPAC

No último dia 3, uma equipe da Agência Espacial Europeia (ESA, em inglês) disponibilizou ao público dados do mais detalhado catálogo de estrelas da Via Láctea já feito. O terceiro release de dados, chamado EDR3 (Early Third Data Release), baseia-se nos 34 primeiros meses de observação, realizados entre julho de 2014 e maio de 2017, e inclui posições e brilhos de mais de 1,8 bilhão de estrelas, além de movimentos, distâncias e cores de 1,5 bilhão delas. Isso significa um aumento de mais de 100 milhões de fontes em relação ao release anterior, o Gaia DR2, publicado em abril de 2018. 

Mais detalhes sobre as descobertas serão apresentados em uma aula aberta na próxima segunda-feira (7), às 16 horas, com o professor Ramachrisna Teixeira, do Departamento de Astronomia do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP e um dos integrantes do projeto.

A medida ótica de aceleração do sistema solar em torno do centro da galáxia, baseada em 1,6 bilhão de quasares (mais distantes e brilhantes astros do Universo) também está disponível. Além disso, informações sobre as nossas “vizinhas” foram publicadas. 

“Até a década de 1960, vizinhança solar significava para nós uma esfera centrada no Sol com 30 anos-luz de raio e aproximadamente 400 estrelas com distâncias conhecidas”, explica ao Jornal da USPprofessor Ramachrisna Teixeira. “No final da década de 1990, esse número saltou para um raio de 80 anos-luz e 5,5 mil estrelas e, agora, temos mais de 300 mil, 92% delas em um raio de 330 anos-luz.”

As exatidões associadas a essas várias grandezas dependem de diversos fatores, tais como quantidade de observações, espaçamento temporal e brilho. No caso do DR3, há precisões que vão de 0,01 a 1,5 milissegundo de grau e de 0,3 a 100 milissegundos de magnitude. Isso quer dizer que os astrônomos são capazes de medir, de maneira confiável, o deslocamento de uma estrela que corresponde ao tamanho de uma moeda de R$ 1,00 vista da Terra.

“O Gaia alterou de forma revolucionária a base de dados sobre a qual repousa toda a Astronomia”, resume Teixeira.

Essa animação mostra os movimentos próprios de 40.000 estrelas, todas localizadas a 100 parsecs (326 anos-luz) do Sistema Solar – Vídeo: ESA/Gaia/DPAC

“Anticentro da Galáxia”

Com os dados mais recentes do Gaia, foi possível rastrear as várias populações de estrelas – velhas e jovens – presentes nos limites da Via Láctea. A nova leva de informação do “anticentro galáctico”, como também é conhecido, permitiu observar as relíquias do antigo disco de 10 bilhões de anos e compará-lo ao tamanho atual do disco da nossa galáxia. Os modelos computacionais previram que o disco da Via Láctea pode crescer com o tempo, à medida que novas estrelas forem nascendo. 

As aferições reforçaram as evidências da quase colisão entre a nossa e a galáxia anã de Sagitário. Os dados das regiões mais externas do disco mostram que há estrelas que se movem lentamente acima do plano da Via Láctea e se dirigem para baixo, enquanto outras se movem rapidamente abaixo do plano e seguem para cima. A galáxia anã de Sagitário possui algumas dezenas de milhões de estrelas e está atualmente sendo canibalizada pela Via Láctea.

Além disso, a base de dados traz novos conhecimentos sobre as Nuvens de Magalhães – duas galáxias que orbitam a Via Láctea. A medição mais precisa do movimento das estrelas da Grande Nuvem mostra que ela tem uma estrutura espiral. Já a análise da Pequena Nuvem mostra um fluxo de estrelas sendo puxado para fora, indicando a existência de estruturas nunca observadas.

“Essa é a grande diferença do Gaia para tudo que já foi feito antes: dados extremamente precisos, homogêneos e abundantes como até bem pouco tempo nem sonhávamos”, enfatiza Teixeira.

Aula aberta

Ramachrisna ministrará uma aula aberta na próxima segunda-feira (7), às 16 horas, onde fará um panorama geral da missão Gaia e dos dados dessa primeira parte do terceiro release, da ciência que vem sendo realizada com os dados do DR2 e o que podemos esperar para o futuro.

A segunda parte do release, conhecida apenas por DR3, será publicada em 2022 e deverá incluir parâmetros astrofísicos e classificações de centenas de milhão de estrelas, velocidades radiais para aproximadamente 30 milhões, classificação de milhões de estrelas variáveis, solução orbital para mais ou menos 100 mil asteroides, estrelas múltiplas, galáxias, “quasares” e galáxias hospedeiras.

A missão Gaia

Gaia é um satélite lançado em 2013 que opera no ponto de Lagrange L2, em direção oposta ao Sol, a uma distância de 1,5 milhões de quilômetros (km) da Terra. Coordenada pela Agência Espacial Europeia, tem o objetivo de entender a composição, a formação e a evolução da Via Láctea.

Desde o início das observações, o Gaia vem varrendo o céu com seus dois telescópios. Cerca de 400 pesquisadores, engenheiros e técnicos compõem a equipe que trata e analisa os dados enviados pelo satélite. Entre eles, estão cinco brasileiros – três deles professores do IAG.

O projeto tem encerramento previsto para 2022, mas pode ser estendido até 2025.

Mais informações: e-mail rama.teixeira@iag.usp.br, com Ramachrisna Teixeira.


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