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Bactérias do fundo do mar produzem matéria-prima para limpeza, cosméticos e alimentos
Com inúmeras aplicações industriais, a surfactina é obtida de bactérias marinhas do gênero Bacillus; projeto na USP quer escalonar produção e tornar produtos mais baratos para o mercado nacional
A bactéria Bacillus subtilis. Startup proposta por pesquisadora poderia viabilizar variações no cultivo para aumentar e baratear a produção de substâncias de interesse, como a surfactina – Fotomontagem de Jornal da USP com imagens de Adrian Daerr/Wikimedia Commons, Reprodução/Freepik e aopsan/Freepik
A busca por produtos úteis para os seres humanos a partir da biodiversidade – chamada de bioprospecção – gera resultados notáveis. Plantas, animais e microrganismos são importantes fontes de medicamentos, alimentos e matérias-primas. O ambiente marinho, apesar de cobrir aproximadamente 70% da superfície da Terra e abrigar uma ampla biodiversidade, ainda é pouquíssimo explorado nesse sentido. Foi, justamente, a partir do estudo de bactérias do fundo do mar do litoral de São Paulo, que a pesquisadora Paula Rezende Teixeira, pós-doutoranda do Laboratório de Farmacologia Marinha (LaFarMar – ICB-USP), idealizou um projeto de inovação. A cientista pretende produzir, em larga escala, substâncias derivadas de microrganismos marinhos que são de grande interesse para diversos setores.
Em um dos projetos de pesquisa de que participa, Paula investiga o perfil químico de bactérias marinhas com o objetivo de compreender o metabolismo desses microrganismos e buscar substâncias produzidas por elas que possam ser do interesse humano. Entre as diversas bactérias coletadas, cultivadas e analisadas, chamou a atenção uma família de compostos específica: as surfactinas, produzidas em grande quantidade por alguns dos microrganismos estudados.
A partir dos resultados do seu projeto científico, instigada por sua supervisora e unindo seus interesses pela ciência, inovação e empreendedorismo, a pós-doutoranda elaborou um projeto para a criação de uma startup com o objetivo de viabilizar a comercialização da surfactina a partir de bactérias marinhas do gênero Bacillus, testando variações no cultivo para aumentar e baratear a produção das substâncias de interesse. “Minha ideia é continuar fazendo o que eu gosto, que é trabalhar com pesquisa e desenvolvimento, mas dentro de uma empresa com a finalidade de lançar produtos para o mercado”, conta. Recentemente, o projeto foi aprovado pelo Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe) e será financiado pela Fapesp.
Paula Rezende Teixeira - Foto: Linkedin
Embora essa família de compostos possua um grande potencial de utilização em vários setores, sua obtenção em grande escala, necessária para ampliar e diversificar seu uso, ainda é um desafio. China e Japão se destacam como os maiores produtores e exportadores de surfactinas, porém o valor de mercado desta matéria-prima ainda é bastante alto, pois o cultivo de bactérias produtoras de biossurfactantes é um processo caro e de baixo rendimento. “O meu objetivo é baratear e escalonar a produção de surfactinas aqui no Brasil, e pretendo utilizar resíduos industriais para otimizar ainda mais este processo”, explica Paula.
Além da experiência adquirida no laboratório, a pós-doutoranda também conta com os aprendizados adquiridos no Programa NIDUS de Residência em Inovação da USP para desenvolver seu projeto. Paula Teixeira, que participou da primeira turma, em 2023, conta que tanto os conteúdos das aulas, quanto os debates com os colegas de diferentes áreas e as mentorias com especialistas, foram muito enriquecedores. A Residência em Inovação tem duração de dois anos e é estruturada de forma a conduzir o pesquisador pelo caminho do empreendedorismo em inovação, para que ele possa colocar em prática suas ideias. O primeiro ano é dedicado à formação e o segundo ano, ao desenvolvimento da empresa e captação de recursos.
Paula Teixeira afirma que o que mais diferencia a academia e o empreendedorismo é o olhar para o mercado de modo a entender para quem e como vender determinado produto. A pesquisadora ressalta, ainda, a importância de se manter sempre atualizado, além de aprender a fazer conexões e procurar ajuda: “A gente não precisa fazer tudo sozinho, mas precisa saber quem buscar”.
A professora Andrea Balan, coordenadora do NIDUS, considera que instituições de ensino superior são repositórios de conhecimento e experiência, e que, ao promover a inovação e o empreendedorismo, o programa facilita a transferência desse conhecimento para a sociedade. Todos os residentes que participam do programa apresentam uma proposta para criação de uma startup no momento da inscrição e, durante o curso, validam e desenvolvem as suas propostas em espaços como o “hostel” de projetos – um local onde os pesquisadores podem iniciar suas atividades em ambiente multidisciplinar, com mentorias para a criação das empresas e auxílio para a captação de recursos. “A residência funciona como uma etapa que antecede e acompanha a criação da startup para atuação futura em uma incubadora”, completa a docente.
Andrea Balan - Foto: Currículo Lattes
Mesmo não sendo um caminho fácil ou trivial, Paula encoraja cientistas a se arriscarem no caminho da inovação: “Se a pessoa tem um produto que ela acredita que pode gerar uma inovação e que pode agregar valor para a sociedade, tem que se arriscar! Ainda tem muito espaço no mercado brasileiro para novas ideias e novos produtos”, finaliza.
Os editais do Programa NIDUS são lançados entre setembro e outubro, para início da residência no ano seguinte. Para a inscrição, além de currículo e documentação, é necessário enviar uma proposta apresentando o problema, a solução, por que ela é inovadora e quais seriam os ganhos para a sociedade.
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