Algas arribadas, que são carregadas pelo oceano até a costa, são visões comuns no litoral brasileiro. Por causa de seu mau cheiro, que afasta os banhistas, elas normalmente são só removidas e incineradas pelas prefeituras ou governos locais. Mas na verdade isso pode ser um grande desperdício.
Uma pesquisa conduzida pela bióloga Talissa Harb, do Instituto de Biociências (IB) da USP, investigou as propriedades químicas e bioativas de extratos naturais de 15 amostras de algas, coletadas nos estados do Espírito Santo, Ceará e Paraíba, e identificou características que podem ser aplicadas nas indústrias de alimentos, farmacêuticas e de cosméticos.
A equipe realizou três expedições para a coleta dos materiais, duas no Espírito Santo e uma no Ceará. Além disso, três amostras adicionais oriundas da Paraíba foram cedidas pelas pesquisadoras Patrícia Guimarães Araújo e Mutue T. Fujii, do Instituto de Pesquisas Ambientais de São Paulo.
As diferentes espécies são divididas em três categorias, determinadas de acordo com os pigmentos presentes nelas: algas pardas (Dictyopteris jolyana, Dictyopteris polypodioides e Zonaria tournefortii), algas vermelhas (Agardhiella ramosissima, Alsidium seaforthii, Alsidium triquetrum, Osmundaria obtusiloba, Botryocladia occidentalis, Spyridia clavata e Gracilaria domingensis), algas verdes (Codium isthmocladum) e duas amostras de misturas de diferentes algas coletadas no Ceará.
Atividade antioxidante
Uma das propriedades avaliadas foi a atividade antioxidante. Há uma grande demanda para antioxidantes (importantes na prevenção de doenças como artrite, arteriosclerose e catarata, entre outras) de origem natural, pois os mais usados atualmente são sintéticos, que possuem efeitos colaterais sérios como danos ao fígado e até carcinogênese.
Os resultados mostraram que as maiores atividades antioxidantes foram encontradas em extratos de algas pardas, seguidos pelos extratos de algas vermelhas, e as atividades mais baixas foram detectadas na alga verde. As propriedades mais eficientes foram encontradas nos extratos de Dictyopteris jolyana, Zonaria tournefortii e Osmundaria obtusiloba.
Atividade antiviral e citotoxicidade
Outra característica analisada foi a atividade antiviral das substâncias presentes nos extratos das macroalgas, uma demanda recorrente de estudos recentes, em decorrência do uso indiscriminado de antibióticos nos últimos anos que levou à evolução de patógenos mais resistentes.
Nesse aspecto, o extrato aquoso de Codium isthmocladum e os extratos metanólicos de D. jolyana, Z. tournefortii, Alsidium seaforthii, Spiridia clavata e O. obtusiloba foram altamente promissores na inibição da transcriptase reversa (enzima encontrada em retrovírus, como o HIV, causador da aids).
Além disso, os extratosde Z. tournefortii, A. seaforthii e C. isthmocladum apresentaram alta atividade citotóxica contra cepas de células tumorais de leucemia e de câncer de cólon, indicando a necessidade de novos estudos para averiguar a possibilidade de instrumentalizá-las no tratamento dessas doenças, explica Talissa.
De acordo com a pesquisadora, o principal objetivo dessa pesquisa foi analisar as propriedades bioativas e a composição química de macroalgas arribadas do litoral brasileiro para fornecer subsídios que permitam identificar as potencialidades de a biomassa de macroalgas arribadas no Brasil tornar-se útil de alguma forma e não ser considerada apenas como lixo ou resíduos sólidos.
“As algas arribadas são um recurso que pode gerar empregos e benefícios econômicos para as comunidades locais e para a indústria comercial”, afirma ela.
A tese de doutorado Caracterização química, potencial antioxidante e atividade biológica de macroalgas arribadas do litoral brasileiro foi defendida em 2021 e pode ser lida na íntegra aqui. O estudo recebeu financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e do Ministério Federal da Educação e Pesquisa da Alemanha.
Mais informações: Talissa Harb, no email talissaharb@gmail.com
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