Fator psicológico pode ser determinante na carreira de jovens atletas

Dados da Organização Mundial da Saúde atestam que o Brasil é o país mais ansioso do mundo; um retrato desse cenário pode ser observado na vida de atletas de alto rendimento, principalmente os jovens

 20/03/2023 - Publicado há 1 ano
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Jogos Olímpicos de Tóquio 2020 – Destaque para o atleta Felipe Santos, aos 25 anos, nas provas de decatlo no Estádio Olímpico de Tóquio – Foto: Jonne Roriz/COB

 

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O fator psicológico pode ser o maior desafio na vida de um atleta de alto rendimento, em especial os jovens, uma vez que as cobranças vindas do público nos estádios, ginásios, pistas de atletismo e, principalmente nas redes sociais, reconfiguram a maneira como esses atletas se envolvem com sua atividade. É o que defendem acadêmicos como Cristiano Roque Antunes Barreira, especialista em Psicologia do Esporte e professor da Escola de Educação Física e Esporte de Ribeirão Preto (EEFERP) da USP.

Cristiano Roque Antunes Barreira – Foto: Arquivo Pessoal

Para Barreira, esses fatores colocam a atividade esportiva de alto rendimento como “esporte espetáculo”, engrandecendo a parte do entretenimento esportivo por quem assiste. Nessa reconfiguração dos atletas com o esporte, não é apenas o desempenho que está sob os holofotes, mas sim a exposição nas redes sociais, ou na chamada grande mídia (televisão, jornais, portais de notícias). “A exposição midiática é organizada em torno do mercado que, por sua vez, é gerido de maneira anônima, impessoal e por uma lógica do lucro. O mercado não tem ética”, diz o professor.

Conforme indicam dados do Atlas da Saúde Mental, realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o país que mais sofre com a ansiedade e as crianças e os jovens são os mais afetados. Portanto, cabe a esses jovens lidar com toda essa cobrança e expectativa criada em cima de sua carreira sem perder de vista, segundo Barreira, que a Psicologia do Esporte não é apenas uma ciência do esporte e do comportamento, mas também uma ciência da pessoa.

O limite das cobranças

“O limite na cobrança de resultados dos atletas jovens deve ser um limite ético”, afirma Barreira. Para o professor, a ética esportiva só pode ser compreendida em uma correlação com o estudo filosófico da natureza do ser e a prática esportiva. A busca pela excelência no alto rendimento, conforme indica o professor, é uma meta que é intrínseca ao esporte, portanto, pensar em fazer cada vez melhor é um processo ligado a esses atletas.

O professor diz que a busca pelo melhor desempenho não é um problema, mas é bom o atleta ter em mente que o melhor resultado muitas vezes não está sob o controle da pessoa. “O que está sob o controle da pessoa é a busca pelo seu melhor desempenho, mas o resultado em si também depende do desempenho alheio, do desempenho da concorrência, daqueles contra os quais e com os quais se disputa”, afirma Barreira.

O limite da cobrança diz respeito ao próprio desempenho do atleta, que sempre almeja mais e, portanto, se superar é se aproximar da próxima zona de desempenho. “As ciências do esporte e as instituições esportivas trabalham em torno de como fazer essa zona ser alcançada e de como proporcionar as melhores condições para que haja o desenvolvimento do desempenho do atleta de alto rendimento”, explica.

Jogos da Juventude 2022 – Basquete Masculino – Foto: Alexandre Loureiro/COB

Pontos positivos e negativos das cobranças

Pelo lado negativo, segundo Barreira, o esporte se debruça sobre a noção de mérito esportivo, o qual responsabiliza o atleta por sua capacidade. Nesse universo do mental se pensa em fenômenos determinantes na carreira esportiva, porém, essa é só a ponta do iceberg, como indica o professor, que muitas vezes é simplificada e distorcida como, por exemplo, na cultura de autoajuda.

Agora, pelo lado positivo, Barreira reforça que a atenção ao impacto da dimensão psicológica na carreira do atleta pode ser associada à totalidade submersa do iceberg. “É lá onde uma história de experiências esportivas que vem desde a base vai construindo não a perseverança de confiança cega, mas sensata e assentada em provas de capacidade atlética que as atrai e que as requer para poder progredir”, diz Barreira.

Essa construção passa pelas nuances da singularidade, na rede de relações psicossociais das instituições esportivas formadoras, famílias, educação formal, atenção à saúde, mais ou menos percepção de justiça nos pontos de partida e distribuição de méritos, conforme explica o professor. “A existência do jovem atleta é atravessada e configurada pela complexidade dessa rede, onde decisões são tomadas, ambivalências são sentidas e recursos psíquicos são desenvolvidos no eixo da prática, em que vitórias, derrotas, bons e maus desempenhos e constatação das próprias condições físicas e habilidades para disputar em alto rendimento vão acontecendo”, conclui Barreira.


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