É preciso repactuar o enfrentamento da violência contra as mulheres no País

A socióloga Wânia Pasinato comenta que é preciso reconceituar a violência contra as mulheres a partir dos conceitos de gênero 

 17/11/2022 - Publicado há 1 ano
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A violência doméstica e familiar contra mulheres e meninas é uma violência baseada no gênero e se apresenta como um problema social de altíssima complexidade. Se manifesta de diferentes formas, frequências e com intensidades também variadas, além de ser uma violência estrutural, ainda muito naturalizada e tolerada pela sociedade brasileira. Essas são as conclusões da socióloga Wânia Pasinato, a convidada desta semana da professora Fabiana Severi na série Mulheres e Justiça

Wânia Pasinato – Foto: Reprodução/NEV-USP

Wânia atuou como coordenadora de acesso à Justiça no Escritório da Organização das Nações Unidas (ONU), em Brasília, e como Assessora Técnica do Escritório USP Mulheres. Atualmente é colaboradora do Grupo de Estudos Direitos Humanos, Política, Memória e Democracia do Instituto de Estudos Avançados da USP.

Segundo a pesquisadora, a violência doméstica e familiar requer políticas públicas que possam compreender essa complexidade e não oferecer apenas caminhos de via única de solução do problema. A pesquisadora conta que essa é sua área de estudo e, de acordo com sua experiência, conhece de perto a política nacional de enfrentamento da violência contra as mulheres, apresentada em 2005 pela Secretaria de Política para as Mulheres, do governo federal, implementada até 2015. “Essa política está centrada sobre os pressupostos da resposta intersetorial, da resposta integrada e articulada, através das redes de atendimento e serviços especializados e da transversalidade de gênero nas políticas públicas, na produção de respostas específicas para atender às necessidades das mulheres que vivem em situação de violência.”

Wânia diz que essa política está estruturada em torno de quatro eixos:  medidas de prevenção; de proteção às mulheres; de promoção de direitos; e de responsabilização. A pesquisadora lembra que a Secretaria de Política para as Mulheres teve um papel fundamental nesses anos de implementação da política, atuando na coordenação da articulação com outros Poderes, Legislativo e Judiciário, para poder aprovar e implementar as leis para responder à violência contra as mulheres em todos os setores. Ainda atuou na articulação com os Ministérios e também com os governos estaduais e municipais. “O que foi possível porque era um órgão forte, com status de Ministério, orçamento próprio e com equipes próprias, tanto administrativa como técnica, inserido num governo que tinha uma compreensão sobre gênero e direitos humanos.”

A partir dessa experiência, a pesquisadora diz que o primeiro desafio para enfrentar a violência doméstica é ter no governo federal um órgão político forte para formular e implementar as políticas para as mulheres. “Temos essa promessa do novo governo que se inicia em janeiro de 2023, de criação de um Ministério de política para as mulheres, e esperamos que esse órgão tenha condições de funcionamento, recursos materiais e técnicos, pessoal capacitado.”

Para Wânia, ter recursos financeiros para essa área é o segundo desafio a ser enfrentando, pois nos últimos anos o orçamento destinado às políticas para as mulheres e, particularmente, de enfrentamento à violência foram sendo reduzidos e o que sobrou para execução das políticas foi sistematicamente deixando de ser utilizado pelos órgãos que se sucederam na responsabilidade de executar essa política, o que gerou um grande vazio e levou Estados e municípios a executar o que conseguiam tendo como referência o que havia sido construído em anos anteriores, o que também gerou um enfraquecimentos das alianças que haviam sido criadas.  

Outro desafio apontado pela pesquisadora com o novo futuro órgão é restabelecer as alianças e repactuar o enfrentamento da violência contra as mulheres no País. “Outro desafio que nós temos é de reconceituar a violência contra as mulheres e reposicionar a resposta a essa violência, a partir dos conceitos de gênero, reconhecido como  produtor da desigualdade social entre homens e mulheres, produtor da desigualdade de gênero, além de a reconceituar também no campo dos direitos humanos, pois nos últimos anos a referência de direitos humanos definitivamente não é compatível tal como conhecemos no campo dos direitos internacionais.”

A série Mulheres e Justiça tem produção e apresentação da professora Fabiana Severi, da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (FDRP) da USP, e das jornalistas Rosemeire Talamone e Cinderela Caldeira - Apoio: Acadêmica Sabrina Sabrina Galvonas Leon - Faculdade de Direito (FD) da USP Apresentação, toda quinta-feira no Jornal da USP no ar 1ª edição, às 7h30, com reapresentação às 15h, na Rádio USP São Paulo 93,7Mhz e na Rádio USP Ribeirão Preto 107,9Mhz, a partir das 12h, ou pelo site www.jornal.usp.br

 


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