Turismo de massa no litoral pode abrir espaço para a inclusão de comunidades tradicionais

Sidnei Raimundo oferece alternativas para um turismo mais sustentável e inclusivo, que incorpore a contribuição de caiçaras e jangadeiros, por exemplo, em atividades socialmente adequadas

 01/04/2022 - Publicado há 2 anos
É preciso incentivar o turismo mais crítico e criativo, a fim de que contribua para a limpeza dos oceanos – Foto: 123RF
Logo da Rádio USP

O turismo de massa no litoral é aquele que evoca a necessidade de se promover a inclusão social de todos os envolvidos com as atividades turísticas, assim como a de contribuir para a conservação da natureza. O professor Sidnei Raimundo, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, explica a importância desse tipo de turismo em entrevista ao Jornal da USP no Ar 1ª Edição.

Desde o final do século 18, segundo o professor, o litoral possui um apelo muito grande, atraindo populações para o seu desfrute. Antes dessa época, o mar era um local de repulsa, pois era por onde os bárbaros invadiam na Europa, esse era o imaginário medieval. Ele conta que a visão sobre o mar deixou de ser tenebrosa no contexto da Revolução Industrial e da Revolução Francesa, um período que gerou um novo tipo de pessoa, que gostava de viajar pelo prazer de viver ambientes diferentes do cotidiano. 

A partir desse momento, o mar passou a ser um atrativo reforçado, inclusive, por algumas ciências, como a oceanografia, que na época defendia que não havia criaturas apavorantes nos sete mares, como o homem medieval imaginava. Outro exemplo é a medicina, que começou a recomendar banhos de mar para que as pessoas ficassem curadas das doenças modernas. “Assim deu início a uma corrida para o litoral gigantesca e uma mudança na postura: começou a vivenciar o mar como ocorre hoje, temos a necessidade de sempre estar ali, se reencontrando com ele. O mar oferece um conjunto de sensações, tem o molhado, o frio da água, o quente da areia, o usufruir ali faz parte da sociabilidade humana atual que deriva do conjunto de atividades ligadas não só ao banho de mar, mas também aos esportes náuticos e pescaria, por exemplo. Essa corrida começou a ser chamada de turismo de massa”, explica Raimundo.

O professor descreve que inicialmente as elites começaram a visitar a faixa litorânea e depois se estendeu para todas as camadas sociais, tanto no Brasil como na Europa. A partir do século passado, houve um grande conjunto de incentivos para que as camadas de trabalhadores começassem a viajar em direção ao oceano. O turismo de massa atinge o seu ápice, enquanto modelo, na Segunda Guerra Mundial até meados dos anos 70 do século passado, quando houve um incremento de investimento de capitais nas faixas litorâneas por conta da urbanização desenfreada nessa área, de acordo com Raimundo. “Não havia preocupação ambiental, mas, sim, interesse apenas econômico. É importante, mas isso gera uma artificialização da paisagem litorânea com incremento de uma infraestrutura que não tinha nenhuma preocupação com a estética e muito menos com a questão ambiental.”

Inclusão social

Sidnei Raimundo – Foto: Reprodução/Opap

Outro aspecto do turismo de massa é a atenção à inclusão social daquelas comunidades tradicionais que ainda remanescem no litoral, como os caiçaras e os jangadeiros. Essas comunidades, que aprenderam em um processo histórico a interagir com o meio, são conhecedoras do meio ambiente. “No entanto, elas foram incorporadas em grandes empreendimentos turísticos (por exemplo, hotéis e restaurantes) como faxineiros, lavadores de pratos, entre outras tantas atividades subalternas, uma forma de inclusão social inadequada. Esse é o grande desafio que nos coloca no século 21”, afirma o professor.

Em relação às questões ambientais, o professor aponta que é necessário garantir um uso turístico na faixa litorânea sem interferir nos limites da natureza, na capacidade dela de se autorrecuperar. Para isso, precisa analisar impactos ambientais de uma equipe multidisciplinar avaliando para garantir espaços adequados para a natureza conviver com o ser humano. Ou seja, onde a natureza é mais resiliente, pode capacitar um número maior de interferências humanas. Para evitar muitos danos ambientais, o professor também sugere um turismo mais sustentável, por exemplo, priorizar passeios de canoas ou barcos motorizados, que prejudicam menos a natureza. 

Já para a questão da inclusão social, o professor aponta a “urgência da participação das populações tradicionais nos processos de tomada de decisão, de como serão as atividades turísticas. Além disso, é preciso incentivar o turismo mais crítico e criativo, a fim de que contribua para a limpeza dos oceanos”.


Jornal da USP no Ar 
Jornal da USP no Ar é uma parceria da Rádio USP com a Escola Politécnica e o Instituto de Estudos Avançados. No ar, pela Rede USP de Rádio, de segunda a sexta-feira: 1ª edição das 7h30 às 9h, com apresentação de Roxane Ré, e demais edições às 14h, 15h e às 16h45. Em Ribeirão Preto, a edição regional vai ao ar das 12 às 12h30, com apresentação de Mel Vieira e Ferraz Junior. Você pode sintonizar a Rádio USP em São Paulo FM 93.7, em Ribeirão Preto FM 107.9, pela internet em www.jornal.usp.br ou pelo aplicativo do Jornal da USP no celular. 


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.