Tratamento eficaz de dependência química parte da adesão do paciente

Jurista comenta que proibicionismo, como sancionado em lei, é uma prática em desarmonia com avanço do mundo

 10/06/2019 - Publicado há 5 anos     Atualizado: 11/06/2019 às 9:19
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O presidente Jair Bolsonaro sancionou, com vetos, o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 37/2013 que autoriza a internação involuntária (sem consentimento) de dependentes químicos e altera diversos pontos do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad). O órgão coordena medidas relacionadas à prevenção do uso de psicoativos, à atenção à saúde de usuários e à repressão ao tráfico. O texto define as condições de atenção aos dependentes químicos e trata do financiamento das políticas sobre drogas, ao modificar a Lei Nacional Antidrogas, de 2006.

De acordo com a professora Helena Regina Lobo da Costa, do Departamento de Direito Penal da Faculdade de Direito, o Projeto de Lei vai de encontro a dois pontos fundamentais em relação ao tratamento da dependência química. “Nem todo usuário é dependente. Um tratamento minimamente eficaz tem como pressuposto fundamental a adesão voluntária do paciente. Se ele não está de acordo, é difícil haver a força de vontade necessária para superar a condição”, diz em entrevista ao Jornal da USP no Ar.

Nesse sentido, a lei foi bastante criticada não só por profissionais da saúde, mas também por juristas. “O usuário de drogas ainda é um ser capaz segundo o direito civil”, diz Helena. Na democracia, o papel fundamental das leis é garantir a segurança em todos os níveis do indivíduo. Além disso, o projeto proíbe as internações em  comunidades terapêuticas acolhedoras. “Em certos casos, a formalidade de hospitais e clínicas desincentiva o dependente químico do tratamento. A proibição não dá conta da complexidade comportamental do usuário de drogas”, explica a jurista.

Foto: Marco Gomes/Flickr-CC

Outra preocupação de Helena é o número de pessoas que poderiam indicar a internação involuntária. “Apesar do médico ter de assinar a determinação, qualquer servidor público do Sisnad ou profissional da saúde ligado ao dependente químico tem o poder de fazer essa indicação”, declara. Internar alguém contra sua vontade é, em certa medida, cercear a liberdade de alguém, assim como o encarceramento. “Não deveria ser uma função delegada a qualquer um”, argumenta a professora.

A jurista comenta que o proibicionismo rigoroso, como posto em atividade no Brasil, é uma prática em desarmonia com o avanço do mundo. “Muitos países estão descriminalizando o uso de drogas, ou pelo menos algumas delas. Parte deles,até legalizam algumas formas de comércio e colhem resultados positivos. É claro que são casos a se analisar com cautela, se estudar, mas há progresso”, conta a professora.

Ela lembra que, embora em prática há muito tempo no Brasil, a dura repressão não mostra eficiência nem no combate ao uso de drogas, pelo lado da saúde, muito menos no combate à violência. “As medidas modernas partem do ponto que a droga vai sempre condizer com o ser humano. Ao longo da história, todas as civilizações tiveram contato com algum entorpecente”, expõe.

Nesse meio-tempo, corre no Supremo Tribunal Federal (STF) um recurso extraordinário que descriminaliza o porte de maconha por usuários. A apelação já teve uma vitória por 3 a 0 na corte, mas segue para nova análise. O governo federal é contra essa perspectiva.


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