Saúde pública deve preponderar sobre liberdade individual na pandemia

Fernando Aith analisa embate entre liberdades individuais e saúde coletiva surgido em meio a medidas de restrição social por conta da pandemia

 14/06/2021 - Publicado há 3 anos     Atualizado: 16/06/2021 as 8:43
O Estado deve adotar medidas sanitárias para conter a disseminação do coronavírus e isso inclui o isolamento, a quarentena, o uso de máscaras e a redução de atividades econômicas e de circulação de pessoas

Por meio da Advocacia Geral da União (AGU), o presidente Jair Bolsonaro ingressou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra medidas estaduais de restrição social e lockdowns, mirando decreto de três Estados brasileiros. Especialistas já apontaram diversas vezes para a eficácia do isolamento social para evitar o contágio do novo coronavírus. O fato marca mais um capítulo da relação entre governo e medidas de contenção da pandemia.

O professor Fernando Aith, do Grupo de Direito em Saúde da Faculdade de Saúde Pública da USP e um dos editores do Boletim Direitos na Pandemia, lembra que liberdade e saúde são dois direitos humanos fundamentais. “Em uma sociedade democrática, nós precisamos entender o que está acontecendo e avaliar se, dentro do cenário em que esse conflito entre saúde e liberdade se coloca, qual é o direito que deve preponderar”, afirmou em entrevista ao programa Jornal da USP no Ar 1ª Edição, lembrando que esse embate já pautou o espaço público quando o governo passou a limitar o consumo de tabaco em locais fechados, o que ajudou a preservar a saúde de não fumantes.

“No caso da covid-19, isso fica muito mais evidente. Estamos diante de uma crise sanitária em que o problema de saúde pública é um vírus transmissível pelo ar e com alto potencial de disseminação e altos índices de mortalidade. Isso exige que o Estado adote medidas sanitárias para conter essa disseminação.” Nesse sentido, o professor Aith e outros especialistas destacam o isolamento, a quarentena, a redução de atividades econômicas e de circulação de pessoas, que, de fato, limitam liberdades individuais, mas em prol da saúde coletiva. “Não é que a liberdade esteja sendo retirada, a liberdade está sendo limitada proporcionalmente na medida que eu necessito limitá-la para proteção coletiva.”

A AGU, ao ir contra decretos estaduais de restrição social, também adicionou risco à subsistência dos indivíduos, fazendo referência ao aspecto laboral nas restrições do isolamento. “É um ponto que chega a ser cínico, porque o problema foi muito bem resolvido com o oferecimento do auxílio emergencial de R$ 600 (em vigor durante 2020), que segurou as pessoas em casa e conteve a pandemia no Brasil. Assim que o governo federal acaba com o auxílio emergencial, essa pressão da subsistência volta e força as pessoas a saírem às ruas, e com isso a pandemia volta.”

Ainda sobre a ação da AGU, o professor Aith menciona que tanto a União quanto Estados e municípios têm competência legislativa sobre o campo da saúde. Porém, em decisão do STF, durante o período da pandemia, serão preponderantes as normas que indicarem o melhor caminho para a saúde pública, as quais o professor credita a Estados e municípios: “Como a União no Brasil se omitiu completamente em adotar normas que protegessem melhor a saúde pública e ter essa postura de liberdade acima de tudo, mesmo quando essa liberdade coloca a vida dos outros em risco, Estados e municípios passam a ter plena autonomia para adotar as medidas que eles julgam mais adequadas para proteger a saúde pública”.


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