Segundo o estudo The Global Threat of Drying Lands, publicado em 2024 pela Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação (UNCCD), mais de 75% das terras do mundo ficaram mais secas nas três décadas anteriores a 2020. Segundo o relatório, as terras secas expandiram-se em 4,3 milhões de quilômetros quadrados, uma área quase um terço maior que o território indiano, o 7º maior país do mundo. Grande maioria dessas terras passou de paisagens úmidas para a seca, gerando grandes impactos para a agropecuária e ecossistema.
A desertificação é consequência de um grave processo de degradação contínua de ecossistemas secos. Ela ocorre exclusivamente em regiões áridas, semiáridas e subúmidas secas do planeta, e, para a professora Sueli Angelo Furlan, do Departamento de Geografia (FFLCH) da USP, o conceito unifica fatores climáticos. “Foi criado para, justamente, associar esses aspectos climáticos com a quantidade de recursos, principalmente água no solo. Então, a desertificação diz mais respeito a essa condição do solo, da capacidade desse solo, em climas desse tipo, de poder garantir as qualidades de recursos hídricos para as plantas, para as culturas e para a pecuária”, explica a professora.
Influenciada por fatores naturais, mas principalmente pela atividade humana, a desertificação é intensificada por fatores como o desmatamento, a superexploração pela agropecuária, o manejo inadequado do solo e dos recursos hídricos, a urbanização e outros fatores que expõem o território e terminam por enfraquecê-lo. E, segundo a pesquisa, os territórios estão cada vez mais degradados. Para Sueli, essa intensificação se dá principalmente pela ação humana. “Vem aumentando porque o mau uso vem aumentando. O uso inadequado, o uso sem conservação do solo, o solo é um componente da natureza que nós temos mais perdido em biogeografias, a gente trabalha isso em quase todos os biomas, a perda, o que vem acontecendo com a perda de solos por processos erosivos e um uso sem conservação do solo.”
Impactos
Os impactos desse degradante fenômeno têm se mostrado cada vez mais óbvios. A pesquisa afirma que, até 2050, três em cada quatro pessoas em todo o mundo (cerca de 7,5 bilhões de pessoas) sentirão o impacto da seca. Além desses, o aumento de temperaturas, a superexposição e lavagem de nutrientes do solo, obstáculos ao cultivo e cuidado da cobertura vegetal são outras consequências ocasionadas pela desertificação nos territórios afetados.
Os resultados da pesquisa mostram que as áreas particularmente afetadas pela tendência de secagem incluem quase toda a Europa (95,9% de suas terras), partes do oeste dos Estados Unidos, Brasil, partes da Ásia (principalmente a região leste) e a África central.
No Brasil, uma das áreas mais afetadas é a região do território nordestino, os chamados “núcleos de desertificação”, onde ocorre de o fenômeno ser mais acentuado: Seridó (RN/PB), Cariris Velhos (PB), Inhamuns (CE), Gilbués (PI), Sertão Central (PE), Sertão do São Francisco (BA). O levantamento do Lapis (Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites) da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), que usa o sistema alemão EUMETCast para monitorar a caatinga com dados de satélites europeus, alerta que a desertificação se intensificou no Nordeste durante a última década e a principal causa seria o seu desflorestamento da região.
Certas práticas podem contribuir para reduzir a desertificação, tais como o reflorestamento de áreas devastadas e a melhoria da gestão da água e do solo. Além dessas, a boa convivência com o solo através da agricultura familiar, bastante cultivada nos Estados nordestinos, é uma boa alternativa de exploração do território sem degradação, como lembrado pela professora: “O solo é um importante recurso da natureza para serviços de suporte para a agricultura e existem formas de conviver com o semiárido, já demonstradas por pessoas, por agricultores tradicionais ou pequenos produtores familiares. Há políticas pensadas para valorizar essas práticas tradicionais, porque o homem da caatinga, o agricultor da caatinga, sempre conviveu com essa situação de semiaridez e ele desenvolveu algumas práticas de manter cobertura ou de trabalhar plantas nativas”.
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