Ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello; presidente da CPI da Pandemia, senador Omar Aziz (PSD-AM); relator da CPI da Pandemia, senador Renan Calheiros (MDB-AL) – Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado – Fotos Públicas
Para Deisy Ventura, Eduardo Pazuello deve eximir-se de responsabilidade em seu depoimento
Na opinião da professora, agentes do governo federal devem ser responsabilizados pela omissão de estratégias eficazes de contenção do coronavírus e pela adoção de estratégias como a imunidade de rebanho
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da covid-19 colocou as respostas sobre a atuação do governo federal na pandemia no centro da agenda política brasileira, atraindo a atenção de grande parte dos brasileiros. Em conversa com o Jornal da USP no Ar 1ª Edição, a coordenadora do doutorado em Saúde Global e Sustentabilidade da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, do Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário (Cepedisa) e editora do boletim Direitos na Pandemia, Deisy Ventura, afirma que “o que a gente vai descobrindo ao longo dos depoimentos é que o governo fez muito pouco e muito mal”, se referindo às falas proferidas durante as reuniões da CPI. Ela conta que publicou no boletim, ao longo do ano passado, a existência de uma estratégia no plano federal de propagação do novo coronavírus, a imunidade de rebanho por contágio. “A gente vê diversos senadores formulando questões nesse sentido e, até o momento, o que a gente observa é que essa tese vem sendo corroborada.”
O depoimento do ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, é o mais aguardado. Ele solicitou ao Supremo Tribunal Federal permissão para permanecer em silêncio, o que foi concedido, porém, com a obrigatoriedade de responder questões sobre o presidente da República. Para Deisy, “existe essa atitude ou de mentir para eximir a sua própria responsabilidade ou de repetir o que nós já sabemos que é a posição do governo federal, negacionista”, reiterando que não se deve esperar nenhuma novidade em relação à postura de Pazuello. O ex-chanceler Ernesto Araújo trouxe diversos elementos que mostram o favorecimento do plano de contágio por imunidade, que podem ajudar os senadores a construir a tese do indiciamento de diversas autoridades federais, “por muito mais do que negligência, muito mais do que erro ou até loucura, como muitos querem dizer, por parte do presidente da República, mas foram ações e omissões coordenadas”, diz a professora.
Ela classifica a situação sanitária brasileira como uma das maiores tragédias, tanto na história do Brasil como de forma comparada em relação a outros países. No entanto, ela observa que o cenário atual não se deu graças a uma só pessoa. “Quando a gente vê mais de 400 mil mortos e mais de 14 milhões de casos em um país que tem um sistema único de saúde, uma tradição de resposta a epidemias, uma referência internacional em cobertura universal de saúde, em programas de vacinações, para que esse desastre siga acontecendo, nós continuamos vivendo essa catástrofe na iminência de um aumento no número de casos e de óbitos. Isso com certeza envolveu uma estratégia institucional, que compreende, claro, a liderança do presidente da República, é inegável”, afirma.
Ainda hoje não existe no Brasil um comitê científico nacional, “desolador para um país que tem um sistema de pós-graduação e pesquisa de produção científica”, lamenta Deisy. Não há, também, uma coordenação nacional no âmbito do governo e, como exclama a professora, “o Ministério da Saúde não exerce a sua competência legal”. Muitas formas de resistência foram empregadas por parte de outros agentes, como a derrubada do veto do presidente Bolsonaro na aprovação da lei que torna obrigatório o uso de máscara, cobranças do Supremo Tribunal Federal em relação a medidas de contenção do vírus e também o papel do jornalismo na cobertura dos fatos.
Deisy diz que, “quando a gente não acompanha o dia a dia da resposta à pandemia, podemos ter a ilusão de que não foi tão grave assim, porque a gente não vê que alguns comportamentos do governo federal são frutos dessa resistência, e não da sua própria vontade”. Embora a CPI da covid-19 esteja confrontando o governo federal, a professora afirma que ainda é muito cedo para comemorar. “A gente espera que o governo federal finalmente mude de posição para que o ministro da Saúde desenvolva uma estratégia verdadeira de contenção do novo coronavírus, porque, enquanto essa estratégia federal continuar, o Brasil segue sangrando”, conclui.
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