Estariam os cobradores de ônibus com os dias contados?

O avanço da tecnologia no transporte coletivo deve tornar obsoleta a função, já quase totalmente descartada, do cobrador

 22/06/2017 - Publicado há 7 anos
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Ônibus sem cobrador – Foto: Reprodução/SPTV

A figura do cobrador pode estar com os dias contados na cidade de São Paulo. Há mais de 15 anos, uma lei obrigava a Prefeitura da capital a manter cobradores nos ônibus municipais. No entanto, uma decisão recente do Tribunal de Justiça de São Paulo considerou-a inconstitucional, embora ainda caiba recurso.  O que vale, porém, é que a posição do TJ deve fazer com que a gestão do prefeito João Doria implante, gradativamente, o processo de extinção da função de cobrador.

Especialista em transporte urbano da Escola Politécnica da USP, o professor Orlando Strambi não vê motivos para traumas a respeito desse assunto. Ele lembra que o avanço da tecnologia, queira ou não, acaba trazendo impactos sobre as atividades profissionais, em particular sobre aquelas que são normalmente desempenhadas pelo ser humano – a partir de um certo momento, é possível que o trabalhador seja substituído por algum equipamento que execute a mesma tarefa com maior produtividade e eficiência.

De resto, Strambi observa que esse não é um problema novo em São Paulo, uma vez que as catracas eletrônicas  começaram a ser implantadas experimentalmente por aqui em 1998, antecedendo ao bilhete único, que viria em seguida. De acordo com ele, não há nada que justifique a permanência do cobrador nos ônibus, pois perdeu sua função até mesmo como mero agente de informação para os usuários, já que hoje estes dispõem de outros meios para isso, como o celular ou a internet. Além do mais, a grande maioria dos usuários, graças ao bilhete único, consegue acessar o ônibus e pagar sua passagem sem necessitar da ajuda do cobrador. Na verdade, estima-se que apenas 6% das pessoas não façam uso do bilhete.

Prefeitura de SP testa primeira linha de ônibus sem cobrador – Foto: Divulgação / SPTrans

O processo, portanto, é inevitável, na opinião do professor da Poli. O que se deve fazer é buscar outras alternativas de emprego para aqueles que deixarão a função de cobrador, posição com a qual concorda o professor Mauro Rodrigues Junior, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP (FEA). Em sua avaliação, a manutenção da função do cobrador representa um pequeno benefício para um grande custo – algo em torno de R$ 1 bilhão por ano é o que se gasta para sustentar o serviço oferecido por esse profissional, valor que poderia, por exemplo, ser destinado a áreas mais carentes, como saúde ou educação.

É claro que a substituição do cobrador, na opinião de Mauro Rodrigues, teria de ser efetuada de forma gradual, sobretudo em uma época em que a falta de postos de trabalho é brutal, como a que vivemos hoje. Seria necessária uma rede de proteção social para proteger essas pessoas que vão ser afetadas, num primeiro momento,  pelo desemprego. O que não se pode, contudo, é barrar a inovação, pois mudanças tecnológicas já aboliram profissões num passado recente, “e o mundo sobreviveu”. Para Mauro Rodrigues, não há sentido em barrar a tecnologia pelo simples motivo de  temer que ela vá gerar desemprego. Isso já foi equacionado em outros países, que deixaram, há muito tempo, de aceitar que o passageiro do transporte coletivo pague sua passagem com dinheiro.

“Acho que a gente precisa encarar o avanço da tecnologia e resolver os problemas decorrentes de sua adoção, não os problemas que decorrem de evitar a sua adoção”, diz o professor Strambi. Ele lembra que, num futuro muito próximo, os ônibus – a exemplo do que já acontece com os carros  – também serão autoguiados, graças ao avanço da mesma tecnologia que hoje elimina a função dos cobradores. Os motoristas, portanto, poderão ser a bola da vez nesse jogo em que se favorece a eficiência dos meios, a modernização dos processos e, principalmente, a economia dos recursos.

 


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