As Tábuas de Mortalidade e sua importância na implantação de políticas públicas

Também chamadas de Tábuas de Sobrevida, são ferramentas estatísticas utilizadas para descrever e analisar os padrões de mortalidade, ou seja, números de óbitos de uma população ao longo de um determinado período de tempo

 Publicado: 07/01/2025 às 12:03
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Imagem estilizada em azul do mapa do Brasil, sobrepondo-se a imagem também estilizada de centenas de pessoas que dão a impressão de caminhar - umas indo outras voltando
Fatores como saúde pública, qualidade de vida, bem-estar social e fenômenos climáticos são pontos de grande importância para a construção das Tábuas de Mortalidade – Fotomontagem Jornal da USP com imagens de: Paulo Pinto/Agência Brasil; FML/Wikimedia Commons/CC BY-SA 2.5

 

A vida, de acordo com o artigo 5 da Constituição Brasileira de 1988, é um direito garantido a todo cidadão brasileiro, assim como a saúde, segurança e outros direitos básicos. Entretanto, é verdade que a configuração do espaço e condições socioeconômicas da população muitas vezes impedem a consolidação desse direito. A área responsável pelo estudo dessas condições de uma população é a demografia, ciência responsável pelo estudo dos seus ciclos de vida, fatores e fenômenos que pertencem à vida humana e é nesse campo onde as Tábuas de Mortalidade, também conhecidas por Tábuas de Sobrevida, estão e são responsáveis pela previsão de expectativa de vida de uma população. 

Tábuas de Mortalidade são ferramentas estatísticas utilizadas para descrever e analisar os padrões de mortalidade, ou seja, números de óbitos de uma população ao longo de um determinado período de tempo. Elas são calculadas a partir de um número de 100 mil pessoas e apresentam indicadores de expectativa de vida, probabilidades de mortes e número de sobreviventes para cada faixa etária, logo oferecendo uma ampla visão sobre como uma população vive e morre.

Mulher branca, cabelos castanhos claros, sorridente, vestindo malha de cor escura até a altura do pescoço e portando em torno do mesmo um crucifixo
Yeda Aparecida de Oliveira Duarte – Foto: CV Lattes

A formulação de tais estatísticas apresenta importantes funções sociais, principalmente em relação ao planejamento e análise de uma população, isto, segundo Yeda Aparecida de Oliveira, professora da Escola de Enfermagem e da Faculdade de Saúde Pública da USP, “existe para que você possa trabalhar tudo, principalmente o reordenamento das políticas públicas, prever o que vai acontecer na população de um país e, com isso, você trabalhar com as políticas públicas para que todo mundo possa ser bem atendido”, explica. 

Fatores como saúde pública, qualidade de vida, bem-estar social e fenômenos climáticos são pontos de grande importância para a construção das tábuas de mortalidade, principalmente nos tempos atuais, quando a mudança climática está entre os principais fatores de desordem social. Um exemplo latente de como fenômenos sociais podem influenciar a taxa de mortalidade de uma população é a pandemia de covid-19, que chegou a reduzir dois anos da expectativa de vida da população, assim como avanços com vacinas, saneamento básico e outros fatores que podem desempenhar o efeito contrário, ao aumentar a expectativa de vida.

Expectativa de vida

As Tábuas de Mortalidade mais recentes, de 2023, divulgadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), indicaram que a expectativa de vida dos brasileiros subiu para 76,4 anos, superando os níveis do período pré-pandemia e registrando um acréscimo de 11,3 meses em relação a 2022. Para os homens, as probabilidades subiram mais significativamente, alcançando 73,1 anos, enquanto para as mulheres a idade é de 79,7 anos. 

Ao comparar a atual expectativa de vida brasileira em 2023/2024 com a de 1940, ano em que a expectativa para ambos os sexos era de 45,4 anos, vê-se um aumento de 30,9 anos, um grande salto em anos de vida. Segundo Yeda, esse salto é devido às constantes evoluções em uma população. “A introdução das vacinas; as crianças nasciam e não morriam, elas sobreviviam. O avanço tecnológico na área de saúde foi muito grande. O saneamento básico foi expandido de forma importante. Então, toda vez que você melhora as condições de vida, você vai diminuir a mortalidade. E, consequentemente, as pessoas, não morrendo, vão viver mais. Então eu tenho que trabalhar para a melhoria das condições de vida da população de um modo geral. E, especificamente, para diminuir a mortalidade infantil.” 

Tais evoluções acontecem em linearidade a uma série de transições demográficas, essenciais ao cálculo das Tábuas de Mortalidade, que ocorrem de maneira não uniforme e são influenciadas pelas desigualdades sociais de cada região. As duas principais são as transições demográficas e epidemiológicas, ambas tratando de processos de transição vivenciados por uma população de acordo com a passagem do tempo. A primeira, referindo-se ao processo de aumento de expectativa de vida de uma população, quando a mortalidade diminui em todas as faixas etárias e concentra-se nos mais idosos. Já a segunda, referindo-se à gradual mudança no perfil das mortes, que avançam de doenças infecciosas até crônicas, mostrando o avanço da saúde pública. Ambas as transições afetam diretamente no cálculo das Tábuas de Mortalidade e também contribuem para a análise das desigualdades sociais entre as regiões analisadas. 

Desigualdade social

Ao comparar-se as Tábuas de Mortalidade de países do Hemisfério Norte, especialmente europeus, que já passaram pelas transições demográficas e enquadram-se como desenvolvidos, às dos países do Hemisfério Sul, ainda em desenvolvimento, percebe-se uma notável diferença. Os padrões de taxa de mortalidade apresentam-se díspares quando países desenvolvidos possuem taxas de expectativa de vida maiores e de natalidade menores, um quadro oposto aos expostos em países do Hemisfério Sul. 

Homem branco, de barba e bigode, usando óculos e vestindo camiseta bege. Ele fala ao microfone do alto do que parece ser uma tribuna
Carlos de Almeida Toledo – Foto: Leonor Calasans/IEA-USP

Essa diferença é proveniente de um longo processo de desigualdade social, no qual países do sul, especialmente do continente africano e da América do Sul, enfrentaram longos processos de colonização e atraso desenvolvimentista, enquanto países europeus, por exemplo, foram líderes de projetos colonizadores e exploração mercantil e escravista internacional. Segundo Carlos de Almeida Toledo, professor do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, “com o fim das relações coloniais, a desigualdade entre os contextos territoriais, por assim dizer, mantém essa separação norte-sul”; entretanto, o professor afirma que tais referenciais não devem ser analisados como absolutos, pois também deve-se considerar a perspectiva de composição interna dos territórios, como a que está presente entre as regiões do Norte e Nordeste, em relação ao Sul e Sudeste, que apresenta fatores de desigualdade social e econômica notáveis entre si. Ao longo das décadas, houve um considerável aumento das desigualdades regionais em termos de expectativa de vida, por exemplo, com a diferença entre a maior (Sul) e a menor (Nordeste e Norte) esperança de vida, no período de 2008 a 2018, aumentando de 5,22 para 5,74 anos para homens e de 4,80 para 5,22 anos para mulheres. Tais desigualdades encontram suas razões em diversos processos de formação populacional, mas, segundo o professor, as influências se dão de diversas formas, tanto econômicas como reprodutivas. 

“Nós temos um processo de precarização do trabalho avançado, o autoempresariado, que faz um discurso muito lógico e direto sobre as condições de responsabilização dos trabalhadores. Mas, se a gente for olhar para isso, as condições de reprodução dessa população são muito mais difíceis, muito mais endividadas, e passam por alguns aspectos que são bem diferentes do que a população que se consolida hoje como a população mais velha da sociedade, especialmente nas metrópoles.” Entretanto, tais desigualdades mostram-se lentamente diluídas frente ao considerável crescimento da expectativa de vida em tais regiões, resultados da aplicação de políticas públicas que abrangem desde a área da saúde até a transferência de renda, que ocasionaram um aumento da expectativa de vida na região Nordeste em 13 anos, chegando a 71,2 anos durante as últimas décadas.


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