Na próxima primavera vamos poder beijar…

Por Maria da Penha Vasconcellos, professora do Departamento de Saúde Ambiental da Faculdade de Saúde Pública da USP

 02/04/2020 - Publicado há 4 anos
Maria da Penha Vasconcelos – Foto: IEA-USP

 

Na virada do ano (2019-2020), um alerta vindo da China notifica a OMS que um novo agente epidêmico desconhecido começava a circular na Ásia oriental – um novo patógeno coronavírus (covid-19).

Áreas de pesquisas como virologia, imunologia, infectologia e as epidemiologias nos abastecem de informações de natureza biossocial com os cuidados preventivos, elaboração de protocolos, subsídio às políticas de saúde pública, sistemas de informação sanitária, vigilância sobre notificações das doenças, tendo como estrutura fundamental os centros de pesquisa e o SUS, de abrangência universal.

Contudo, pesquisas e ações de fundamental importância no campo da saúde pública para a melhoria da sanidade pessoal e do meio ambiente contam também com a necessidade de ações da própria comunidade e sociedade de uma maneira geral, sobretudo, utilizando-se do conhecimento científico produzido para seu bem-estar, saúde e salubridade do meio.

Os hábitos e rotinas na comunidade passam por esforços dos grupos sociais em romper a cadeia de transmissão comunitária, o que exige repensar nossas condutas e etiquetas nas relações sociais, desde a maneira que lavamos as mãos, como lidamos com o cuidado com o nosso corpo, como circulamos em lugares públicos, restrições em viagens e lazer e, no limite, o isolamento familiar e social.

Entre vários hábitos, o beijo, como forma de expressão de afeto e carinho pelo outro, faz parte do nosso repertório social. Em nossa percepção o beijo tem vários significados, sempre carregados de grande emoção.

No Ocidente, o ato de beijar foi e ainda permanece como parte de valores e desejos representados na literatura, artes plásticas, fotografia, sendo o mais icônico por meio da sétima arte. A indústria criativa fílmica consegue expressar o ato de beijar como momentos inesquecíveis, como, por exemplo, em Casablanca, com Humphrey Bogart e Ingrid Bergman, ou Vivien Leigh e Clark Gable, em … E o vento levou.

Porém, nesse período de transição entre as condições saudáveis e as condições adversas da circulação ativa do novo vírus, é recomendável rever esse ato de grande significado afetivo em nossa vida social e pessoal.

As doenças infectocontagiosas colocam a necessidade de praticarmos as denominadas etiquetas – social, higiênica e respiratória – em períodos epidêmicos, visando ao cuidado de si e ao cuidado do outro.

O beijo e a saliva são veículos potentes na transmissão de agentes etiológicos e, no recente episódio da covid-19, requer criatividade sobre o ato de beijar. O beijo pode ser substituído por outras formas de afeto, talvez um reconfortante abraço ou pelo namastê, com um caloroso sorriso, levantando a palma da mão, encostando o antebraço ou ainda as pontas dos pés.

Com o passar do tempo vamos perceber que essas mudanças ajudam a mitigar a cadeia de transmissão do vírus e, então, é só aguardar a próxima primavera para nos beijarmos.

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