De aprendizados e esperanças

Por Maria Luiza Tucci Carneiro, professora livre-docente e coordenadora do Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação (LEER), do Departamento de História da FFLCH/USP

 21/12/2020 - Publicado há 3 anos     Atualizado: 23/12/2020 as 11:19
Maria Luiza Tucci Carneiro – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

 

Durante as múltiplas quarentenas impostas pela pandemia da covid-19, constatamos que o reino da saúde, no qual optamos viver, tem fronteiras frágeis, circundadas por armadilhas escancaradas que, nem sempre, a ciência e os cientistas têm condições de prever. Uma destas armadilhas foi provocada pelo próprio presidente da República, que, enquanto representante do Estado democrático e guardião da vida dos brasileiros, se negou a tratar o assunto como de interesse coletivo. Privilegiou seus interesses pessoais, negou a capacidade que a ciência e os cientistas têm de salvar vidas e negligenciou a necessidade emergencial de recebermos informações precisas sobre os diagnósticos e as consequências reais da covid-19.

Aprendemos que a pandemia é um fenômeno coletivo que exige múltiplos saberes, pois a covid-19 (assim como outras tantas pestes que já atingiram a humanidade) não tem preferência por classes sociais nem por ideologias. Mas, em tempos de crise, atinge as minorias étnicas que, há séculos, estão vulneráveis, fragilizadas pela corrupção, pelo tráfico de drogas, pela falta de assistência à saúde e pela ausência de ações educativas/preventivas.

Aprendemos que o SUS é um bem público e que, durante a pandemia, ajudou a salvar milhares de brasileiros, principalmente neste país com desigualdades econômicas e sociais tão profundas, seculares.

Aprendemos também que a ciência e os cientistas podem buscar soluções na história das epidemias históricas, que se repetem por séculos, com semelhanças tanto na forma de propagação como de diagnósticos para a contenção das doenças.

São muitos os desafios, dada a dimensão do problemas. Em 2021, esperamos que:

• a politização da vacina contra a covid-19 não obstrua o real objetivo da vacinação em massa, que é a de salvar vidas. Esperamos também – e este é um dos legados benéficos desta crise humanitária, que o Estado brasileiro dê credibilidade aos cientistas, disponibilizando recursos, cada vez maiores, para as pesquisas em todos os campos do conhecimento; além de aprimorar o SUS e os hospitais universitários que devem estar disponíveis a todos os cidadãos;

• a história das pandemias passe a fazer parte do conteúdo obrigatório a ser implementado nos programas escolares, pois as experiências científicas do passado indicam caminhos para a ciência do futuro;

• os cursos educativos de prevenção e combate ao racismo estrutural ajudem a salvar vidas, independente das crises políticas e de saúde pública.

Por parte do LEER (Laboratório de Estudos sobre Etnicidade), estaremos abrindo uma importante frente de investigação em busca do legado de cerca de 120 cientistas que, a partir de 1933, contribuíram para os avanços da ciência no Brasil.


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