Conversa com Marques de Melo

Carlos Chaparro é professor aposentado da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP

 28/06/2018 - Publicado há 6 anos

Foto: Cecília Bastos / USP Imagens

A existência física de José Marques de Melo
esgotou-se aos 75 anos, dia 20-06-2018.
Na mesma data, e logo que soube
do seu falecimento, escrevi em jeito de carta,
e postei nos meus espaços do Facebook,
o texto que abaixo transcrevo.

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Querido amigo:

Recebi hoje a notícia da tua morte. Um infarto fulminante te levou para outra dimensão da VIDA. E faço questão de acentuar a palavra VIDA por não acreditar na morte. Sim, meu amigo: para mim não existe o processo da morte. O que existe é o processo da vida, do qual o falecimento físico faz parte.

E porque para mim a morte não existe, faço também questão de pedir licença para te usar como interlocutor nesta “Janela de Diálogo”, que por coincidência hoje inauguro no Facebook, como espaço de conversas abertas sobre JORNALISMO, área do conhecimento que muito te deve.

A convicção racional que me leva a descrer da morte conduz-me, também, à evidência de que na morte, e com ela, a vida se prolonga. O teu próprio exemplo me dará razão. Usaste o tempo e os dons da existência física para construir e reelaborar VIDA. E porque assim foste e fizeste, vivo continuarás – nos efeitos da obra realizada e nas multiplicadoras descendências genéticas e intelectuais.

No teu caso, amigo Zé, descendências herdeiras do conhecimento por ti produzido e organizado no muito que pensaste, escreveste e disseste. Mas herdeiras, também, dos compromissos que assumiste e nos ensinaste a assumir, em favor dos valores humanistas da democracia.

Por caminhos de concordâncias e divergências, tu me fizeste um dos herdeiros. E como teu herdeiro de saberes e responsabilidades, faço questão de transcrever parte de um texto que sobre ti no meu blog, que postei, a 25 de fevereiro de 2016. Naquela data, a propósito do Prêmio Iberoamericano de Teoria da Comunicação, a ti outorgado, assim escrevi, em tom de conversa entre nós:

O prêmio atribuído homenageia em ti não apenas o cientista e o líder científico, produtor e organizador de conhecimento, mas também o persistente construtor da hoje vigorosa identidade institucional da área de Comunicação – no Brasil e nos espaços iberoamericanos.”

“O prêmio que vais receber, amigo José Marques, chega no momento ápice desse processo, já que, na plenitude da maturidade intelectual, além de seres presidente de honra da Intercom (entidade que nasceu com o teu DNA e o conserva), ocupas atualmente a presidência das duas mais representativas entidades da área: a Federação Brasileira e a Confederação Ibero-Americana de Associações Científicas de Comunicação.”

“Penso, porém, que o mérito dessa atuação de liderança não deve ofuscar a relevância científica da tua extensa produção intelectual, como pesquisador e pensador da área de Ciências da Comunicação. Tudo resultando em textos publicados – dezenas de livros, centenas de artigos, milhares de palestras e conferências.”

“O conjunto da obra constitui, sem dúvida, o nosso mais importante acervo organizador do conhecimento, na área da Comunicação. Portanto, uma bibliografia de referência essencial.

Mas faço questão de recortar, no conjunto da obra, os teus estudos sobre Jornalismo, espaço especializado no qual prioritariamente te situas. A esses estudos devemos, sem dúvida, avanços irreversíveis na descoberta e no entendimento das complexidades agregadas ao Jornalismo pelas modernas tecnologias e por suas decorrentes e revolucionárias transformações socioculturais.”

“O livro Jornalismo – Forma e Conteúdo, de 2009, é uma bela sinopse da vasta contribuição de ideias dada por ti aos estudos do Jornalismo. Nele, estão claramente demarcados os itinerários intelectuais, políticos e culturais do professor, do pesquisador e do pensador de jornalismo José Marques de Melo, incansável provocador de controvérsias.”

“Embora com fortes traços autobiográficos, é, na essência, um livro de ideias. E nessa faceta da obra te encontramos e identificamos – porque, sendo um livro de ideias, ele te expõe e te coloca em lugar próprio, acima das circunstâncias do tempo.”

*****
Amanhã, irei ao Cemitério Morumbi. Em jeito de despedida, te direi: “Descansa em paz, amigo! – e zela por nós, os herdeiros, para que nada de ti se perca.”

No mais, prometo releituras regulares dos teus textos, para novas e renovadas conversas de aprendizado.

Até amanhã!

Carlos Chaparro

* Este texto do professor Chaparro foi publicado originalmente no seu blog “O xis da Questão“.

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