A confusão do governo Doria perante a pesquisa no Estado e a Fapesp

Por Hernan Chaimovich, Professor Emérito do Instituto de Química da USP e ex-presidente do CNPq

 18/12/2020 - Publicado há 3 anos
Hernan Chaimovich – Foto: IEA/ USP

 

No artigo 22 da Lei 17.286/2020, que estabelece as diretrizes orçamentárias para o Estado de São Paulo em 2021, pode-se ler que “A mensagem que encaminhará o projeto de lei orçamentária deverá conter […]: V – demonstrativo dos recursos destinados à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – Fapesp, para aplicação em desenvolvimento científico e tecnológico, nos termos do artigo 271 da Constituição do Estado”. Porém, o Projeto de Lei do Orçamento (PL 627) orça a receita destinada à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) em R$ 1,06 bilhão, valor que desconta cerca de R$ 454 milhões da entidade usando erroneamente a Desvinculação de Receita de Estados e Municípios (DREM) (Emenda Constitucional 93/2016). No mesmo Projeto de Lei (PL 627), no Artigo 11, se lê que “§ 3º – Caso as alterações legislativas propostas não sejam aprovadas ou sejam parcialmente aprovadas até 31 de dezembro de 2020, de forma a não permitir a integralização dos recursos esperados, as dotações à conta das referidas receitas condicionadas serão canceladas no todo ou em parte, mediante Decreto do Poder Executivo” e “§ 5º – O Decreto de que trata o § 3º deverá ainda efetuar os ajustes necessários na presente Lei, a fim de que sejam cumpridos o disposto no artigo 271 da Constituição do Estado de São Paulo, bem assim do que trata o artigo 5º da Lei nº 17.286, de 2020.”Interessante notar, destarte, que uma lei ordinária reconhece (?) que o artigo 271 da Constituição estadual determina que “O Estado destinará o mínimo de um por cento de sua receita tributária à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo” e, ao mesmo tempo, desrespeita a Constituição mais adiante quando invoca a PEC 93/2016 e o artigo 22 da Lei 17.286/2020, que fixa as diretrizes orçamentárias para 2021.

Se o leitor julga que este texto é confuso, permita-me traduzir. O governador Doria assegura que irá cancelar (pagar?) tudo, ou parte, dos R$ 454 milhões que retirou da Fapesp alegando a legalidade da DREM por meio de um decreto posterior (quando?). Podem-se imaginar formas de negociação, numa crise que todos reconhecem, que não atentassem contra a autonomia da Fapesp. O governo optou, todavia, pelo mecanismo mais cruel, que derruba a autonomia com a promessa de negociar, por decreto, a recomposição financeira sem pensar nas perigosas implicações para o desenvolvimento do Estado de São Paulo. Qual o propósito?


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