Por que o Brasil não cresce?

Por Paulo Feldmann, professor da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) da USP

 15/08/2022 - Publicado há 2 anos     Atualizado: 23/08/2022 as 15:02

Somos um país com a economia estagnada há quase dez anos. O índice que melhor registra esse fato é a renda per capita, que é o PIB dividido pelo total de habitantes. Hoje, no Brasil, esse valor mensal é de R$ 2.840 – praticamente o mesmo de 2013. Apesar de todos os problemas que aconteceram na economia mundial em anos recentes, são raros os países que tiveram um desempenho pior que o nosso.

Importante nessa hora é o diagnóstico correto das causas que geram esta situação pois elas continuam presentes e, na verdade, pioraram recentemente. A teoria econômica hoje está muito madura e afirma que os países crescem sobretudo por duas razões: ou existem investimentos produtivos, principalmente na infraestrutura, que são fortes geradores de emprego ou existem outros mecanismos que permitem aumentar significativamente o poder de consumo da população. Nesses nove anos, foram poucos os períodos em que esses dois aspectos estiveram presentes no Brasil. Precisamos, portanto, saber o porquê.

Com relação aos investimentos, não tivemos nem os que são realizados pelos governos, e nem aqueles realizados pelas empresas privadas. Os investimentos governamentais, que são os mais importantes, foram muito pequenos devido aos problemas fiscais – com isso, praticamente em todo o período os gastos governamentais foram sempre maiores que as receitas decorrentes dos impostos arrecadados. Essa diferença negativa nas contas, denominada déficit primário, faz com que o governo federal tenha que limitar seus investimentos. Como esses déficits aumentaram consistentemente nestes últimos anos, o valor investido também caiu, ano após ano. Em 2021 os investimentos públicos foram de apenas 2% do PIB e, juntamente com o valor de 2017 que foi de 1,94 %, foram os dois mais baixos de uma série histórica de quase 50 anos.

Infelizmente também não há investimento privado. Este deixou de acontecer porque as empresas ficaram inseguras quanto ao futuro, temendo a piora nas condições, o que efetivamente aconteceu. Além disso, as empresas se ressentem da falta de planos governamentais de longo prazo que digam quais serão as prioridades do País. Quando estes acontecem, as empresas podem avaliar com mais segurança que tipo de investimento pode valer a pena.

Do lado do consumo, a situação nestes últimos nove anos foi de constante e permanente deterioração. Houve um crescimento muito grande do desemprego e do número de trabalhadores informais, aqueles que vivem de “bico”, com acentuada queda na sua renda média. E apesar de ser um dos países mais populosos do mundo, o que poderia gerar um enorme mercado consumidor, nosso país tem um problema crônico de má distribuição de renda que faz com que metade das famílias esteja nas classes D e E, onde praticamente o único consumo existente é o de subsistência. Mas esse tipo de consumo também sofreu muito, e o sintoma mais claro foi o aumento das pessoas que passam fome no Brasil, situação que hoje atinge 15% da população.

Ora, se não houve nem investimento governamental nem privado e o consumo tem diminuído, o Brasil não poderia mesmo ter tido crescimento significativo no período. Preocupa o fato de que 2023 começará com uma situação ainda pior, pois este governo conseguiu recentemente aprovar duas PECs no Congresso – a desoneração da gasolina e a chamada “PEC kamikaze” – que agravam muito a situação, pois jogam um rombo de caixa adicional de quase 175 bilhões de reais para 2023.

Em suma, as causas para todo esse nosso atraso não só vão continuar pelo menos até 2023, como o novo governo vai se deparar com uma situação calamitosa, a qual precisará ser combatida com vigor desde o início. Esperamos que ao menos haja um clima de confiança na recuperação da economia. Isso poderá ajudar na busca das soluções, mas que, mesmo se bem elaboradas e adequadas, só se farão sentir no mínimo daqui a um ano e meio. Feliz 2024!


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