Nomeação de Galípolo impacta o futuro da taxa de juros no Brasil

Por Luiz Roberto Serrano, jornalista e coordenador editorial da Superintendência de Comunicação Social (SCS) da USP

 09/05/2023 - Publicado há 12 meses     Atualizado: 12/05/2023 as 18:22

Duas notícias na área econômica chamaram a atenção neste começo de semana. Uma, a indicação pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, do secretário executivo de sua pasta, Gabriel Galípolo, para diretor de Política Monetária do Banco Central, nome a ser aprovado, ainda, pelo Senado. Trata-se do primeiro movimento de Haddad para mudar, dentro dos prazos legais, a diretoria do BC, cuja atual política de manutenção da taxa de juros, de 13,75%, vai na contramão dos estímulos necessários para a retomada do crescimento econômico.

A partir dessa posição, Galípolo já é considerado sucessor, em 2025, do atual presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que está no cargo, com estabilidade, desde o governo anterior. O que aponta, com a esperada troca de outros diretores, na direção de um BC mais afinado com a política econômica do governo Lula, que aposta na queda de juros para gerar investimentos e alimentar o crescimento da economia brasileira.

A outra notícia veio de declarações do presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Josué Gomes, em reunião na entidade com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco: “É inconcebível um país tão rico como o Brasil praticando uma taxa de juros tão alta. Taxa de 8,5% real, descontada a inflação, é inconcebível”.

Gomes, presidente da Coteminas, dá prosseguimento às campanhas de seu pai, José Alencar, vice-presidente dos governos Lula no começo deste século, que deblaterava permanentemente contra o valor da taxa de juros na época. De fato, se há um setor que é prejudicado por juros altos no Brasil é a indústria, cujo peso no PIB despencou para 23% depois de bater em 37% em 1985, além dos avanços tecnológicos pelos quais o setor passou no mundo, desde então.

As duas informações indicam que a questão central para o crescimento da economia brasileira continua, cada vez mais, na ordem do dia, pressionando a atual estratégia de Campos Neto, que promete começar a baixar os juros apenas um pouco mais à frente, guiado e freado por suas convicções ortodoxas sobre a atuação de um BC que só recentemente, no governo Jair Bolsonaro, ganhou autonomia vis a vis à Presidência da República.

Nesta terça-feira, 9, veio a público a ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), realizada nos últimos dias 2 e 3 de maio passados, que explica as razões para manter, mais uma vez, a taxa de juros nos atuais 13,75%. “O processo desinflacionário em seu atual estágio demanda serenidade e paciência na condução da política monetária para garantir a convergência da inflação para as suas metas”, diz um trecho da ata, que também busca inspiração no comportamento dos bancos centrais por todo o mundo. Diz a ata, sobre esse tema: “A sinalização majoritária entre as autoridades monetárias é de um período prolongado de juros para combater as pressões inflacionárias, o que requer maior cautela nas políticas econômicas por parte dos países emergentes” – frase que, no final, passa a impressão de ser um conselho ao Ministério da Fazenda brasileiro.

A imprensa, é claro, foi buscar a opinião do “mercado” sobre a nomeação de Galípolo para o Banco Central. “Mercado” que é composto pelas empresas financeiras – bancos, corretores etc. -, reguladas pelo BC, que têm e sempre tiveram grande influência sobre as diretrizes de atuação do banco.

Usando-se uma linguagem popular, pode-se dizer que deu coluna do meio nas opiniões de gestores que evitaram críticas diretas, mostrando compreensão da inevitabilidade do movimento de Fernando Haddad, mesmo que preferissem outro nome, e os que praticamente a carimbaram como uma escolha política, quase sacrílega, com a finalidade de interferir nas atuais diretrizes do BC.

Prevalece no “mercado” e na grande mídia a ideia de que a atuação do Banco Central é e deve ser técnica, passar ao largo das tendências políticas de governos, quaisquer sejam as consequências dessa postura. Seja acelerar ou desacelerar a velocidade do crescimento ou encolhimento da economia e as decorrências sociais resultantes, como concentrar ou melhorar a distribuição de renda – e, consequentemente, o padrão de vida da população. Sempre em nome do combate à inflação.

Diga-se que a inflação do último mês de março foi de 4,65%, menor do que a de fevereiro, que bateu em 5,6%. A meta para este 2023 é de 3,5%, que o BC persegue ferozmente com os 13,75% de juros, que subsistem desde o esbanjador governo de Bolsonaro, que não poupou gastos para tentar vencer a eleição. Campos, presidente do BC, insiste em manter a taxa alta.

O governo do PT se sente obrigado a fazer a economia crescer, como prometeu nas eleições, e até admite uma inflação um pouco maior do que a meta dos 3,5% para incentivar esse avanço e gerar maior produção no País.

A indicação de Galípolo para a Diretoria de Política Monetária do BC, ainda a ser aprovada pelo Senado Federal, foi mais um passo na atual disputa entre Ministério da Fazenda e Palácio do Planalto versus o Banco Central. No meio, a saúde do futuro da economia da sociedade brasileira.

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