Assistência social na Amazônia mostra presença forte do Estado

Pesquisa na tríplice fronteira do Brasil, Peru e Colômbia aponta como o Estado se faz presente na região por meio do Bolsa Família e mostra o protagonismo das mulheres

 15/06/2020 - Publicado há 4 anos
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Flávia Melo, doutoranda da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, defenderá, no próximo mês, sua tese Cadastrar, Incluir e Proteger: As Malhas da Assistência Social na Fronteira Amazônia. A sua pesquisa teve como foco a tríplice fronteira do Brasil, Peru e Colômbia, nas cidades localizadas no Alto Solimões, para entender como o Estado se faz presente na região por meio do Bolsa Família. Nesse aspecto, o trabalho procurou dar destaque para as mulheres beneficiadas pela política governamental.

“Não se trata de uma avaliação da política pública, mas entendê-la na sua efetividade, na forma que ela é praticada pelas agentes que fazem acontecer no cotidiano daquela região”, explica Flávia em entrevista ao Jornal da USP no Ar. Para fazer isso, ao longo de quatro anos, ela acompanhou os serviços, enfrentou filas de cadastramento de programas, acompanhou reuniões, realizou entrevistas e coleta de dados pelas redes sociais, sempre focada no recorte das mulheres, o qual se mostra bem típico naquela região, compreendendo uma composição étnico-racial diversificada e distinções de locais de origem. “A capilaridade da assistência social nessa região, mas não apenas, é impressionante.”

Segundo a pesquisadora, são altos inclusive os porcentuais de cadastrados em uma mesma cidade. Cerca de 40% da população de Tabatinga (AM) está no Cadastro Único (CadÚnico), número significativo, considerando que essa população está espalhada não apenas na sede, mas em comunidades indígenas e ribeirinhas, a que se deve acrescentar a distância geográfica dentro dos próprios limítrofes municipais. “[Percebemos] então como os mecanismos dessa tecnologia foram eficientes em enxergar e cadastrar essas pessoas. Essa ferramenta é muito interessante, mas também ambígua: ela permite acessar essas pessoas e fazer chegar a elas o Bolsa Família, porém, provoca uma série de deslocamentos e impõe uma dinâmica de inserção pelo consumo”, aponta Flávia.

Contudo, isso não significa que a política é danosa. “Eu me somo a intelectuais que defendem não somente políticas como o Bolsa Família, mas políticas amplas de renda mínima, que não teria condicionalidades e seria universal, o que não é o caso do Bolsa Família nem do Auxílio Emergencial”, destaca Flávia Melo. Esse auxílio tem se mostrado controverso com a automatização de processos, sem passar pelo caráter de análise humana feito no cadastramento da assistência social. 

“Critérios que ganham vida própria e se tornam números são escolhidos e discutidos. Isso ajuda a problematizar a demora de pessoas em análise para o benefício: essa demora é simplesmente  em razão de uma grande demanda ou esse tempo de espera não faz parte dessa forma de governo?”, questiona Flávia. Perguntas que fazem sentido e que servem para desconstruir a questão do problema com internet, falta de usabilidade do usuário com o aplicativo e incoerências no CPF. “Todas essas questões são trabalhadas e pensadas, elas fazem parte do modo que a política opera.”

Ouça a entrevista na íntegra no player acima.


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