Turma da USP apresenta peça de Bertolt Brecht no Teatro Laboratório

Com direção da professora Cristiane Paoli Quito, peça fica em cartaz até o dia 17 de dezembro, na Cidade Universitária

 11/12/2017 - Publicado há 6 anos
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Detalhe do cartaz da peça Um Homem é um Homem, adaptação da obra de Bertolt Brecht, sob a direção de Cristiane Paoli Quito – Foto: Divulgação / EAD

Está em cartaz no Teatro Laboratório da Escola de Arte Dramática (EAD) da USP a peça Um Homem é um Homem, do dramaturgo alemão Bertolt Brecht (1898-1956). O texto encenado pela Turma 67 da EAD, com direção da professora Cristiane Paoli Quito, é uma mescla da tradução de Fernando Peixoto do original de Brecht e da adaptação de Paulo José para o Grupo Galpão, tradicional companhia de teatro fundada em Belo Horizonte (MG).

“No final, fizemos um caminho entre as duas versões. A tradução do Fernando Peixoto, por ser do texto original, tem uma densidade maior; já a versão do Grupo Galpão tem uma aspecto de ligeireza, que traz uma comicidade diferente daquela do texto de Brecht, cujo jogo de frases e palavras é cômico de maneira irônica, menos deslavada, mas nos leva a situações inusitadas”, explica a professora.

A história se passa durante a ocupação ocidental em um país do Oriente (que, na adaptação do Grupo Galpão, ganha referências à guerra do Iraque) e tem como protagonista Galy Gay, um cidadão comum que não sabe dizer “não”. Por conta dessa característica, ele é facilmente manipulável e passa por múltiplas transformações conforme interage com outros personagens: ao sair para comprar peixes, acaba comprando uma cesta de pepinos para a dona de uma cantina, para depois envolver-se com o exército, substituindo um soldado perdido durante um assalto a um templo.

“Por não conseguir dizer ‘não’, ele vai se desfazendo do seu caminho, vai seguindo caminhos alheios”, analisa Cristiane. “E, ao ser manipulado, aprende a manipular. Ele é convencido a substituir o soldado perdido no exército em troca de charutos e cerveja, e logo começa a manipular os outros soldados da mesma forma, e fica incerto quem precisa de quem nesse contexto. Assim, a peça toca nessa questão de quem corrompe e quem é corrompido, e de como dar poder a alguém que não tem condições de possuí-lo pode gerar terror. São questões muito atuais, especialmente no momento que vivemos no Brasil. Embora o texto tenha sido publicado em 1926, a humanidade continua voltando a elas.”

A professora Cristiane Paoli Quito, da Escola de Arte Dramática da USP – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Essas fortes indagações essenciais são tratadas no texto de maneira irônica, de acordo com a professora, com uma abordagem intensa e cômica das contradições, como a ingenuidade e a sagacidade do homem. “Nossa capacidade de fazer escolhas nos nossos caminhos, a quem damos poder para nos manipular e quem manipulamos, a iminência da guerra, tudo isso é discutido. Em certo momento, o texto diz ‘acabou o caos, a guerra começou’. Que realidade é essa onde estruturas de destruição são a salvação? Em outro trecho, o texto afirma que ‘certamente, a única certeza é a dúvida’. Um homem é um homem, não apenas o que ele faz, se é soldado, civil, mas é sua essência. Além da interpretação, do jogo do teatro, é esse tipo de estudo que queremos fazer, refletir sobre a natureza do homem. Esse trabalho foi um grande estudo”, completa a professora.

O elenco de 16 alunos possibilitou a Cristiane trabalhar com múltiplos atores para um mesmo personagem, seja em momentos diferentes da peça, seja ao mesmo tempo, fazendo assim uso do conceito brechtiano de gestus, em que cada personagem tem um conjunto de características gestuais e de atitude que o define. “Temos, por exemplo, cinco Galy Gays. O personagem tem um gestus próprio que é reconhecido sempre que um ator sobe no palco interpretando-o, mas, com vários atores representando o mesmo papel, podemos ver múltiplos prismas dele, por isso gosto de trabalhar dessa forma.”

Cristiane afirma que a obra de Brecht foi escolhida porque o último trabalho da Turma 67 havia focado na improvisação. Logo, a ideia era trazer um texto de dramaturgia mais “clássico”, embora moderno, e numa estrutura mais fechada, não improvisacional. “O que nos interessa é a relação do processo, do amadurecimento da obra conforme os alunos a ensaiam e apresentam. Isso marca todos os nossos trabalhos na EAD”, afirma a diretora da peça.

O espetáculo Um Homem é um Homem, de Bertolt Brecht, fica em cartaz até 17 de dezembro, com entrada gratuita. As apresentações ocorrem de terça a sábado, às 21 horas, e no domingo, às 20h30, na Sala Alfredo Mesquita do Teatro Laboratório da EAD. O endereço é Rua da Reitoria, 215, na Cidade Universitária. Mais informações pelo telefone (11) 3091-4376.


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