Arte de Matuck não tem regras nem respostas

O artista e professor da USP Arthur Matuck apresenta sua trajetória na Casa da Xiclet Galeria, em São Paulo

 26/04/2017 - Publicado há 7 anos
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Matuck: pioneiro da arte multimídia brasileira apresenta quatro décadas de uma trajetória incompleta – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

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O mestre Arthur Matuck, da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, é daqueles que os alunos amam. Ou deixam. Nas salas de aula, graduação ou pós, está sempre cercado por estudantes ou jovens artistas querendo saber do universo da medium art. Espaço que o mestre habita desde o início da década de 1970 e é considerado um dos pioneiros da arte midiática contemporânea. Participar, entender, se orientar são as questões. Mas, depois que o aluno percebe que se orientar ou entender não é regra, todos os caminhos se abrem.

São exatamente esses caminhos meio desorientados de quem está sempre buscando que o artista e mestre Matuck apresenta na exposição Medium Arte: Uma Retrospectiva Incompleta. São mais de 40 anos de história e arte registradas nas paredes da Casa da Xiclet Galeria, na Vila Madalena. Uma mostra que exige muito mais do que um simples olhar, do que um mero juízo de espectador. Pelo contrário. O espectador – bom lembrar que a entrada é franca – pode ou não mergulhar em uma arte que foge do óbvio.

“Reunimos projetos de experimentação com diversas mídias. Há desenhos, xerox, colagens, gravuras, fotografia, fax e a televisão de varredura lenta, que é um instrumento de audiovisual de modo a mostrar como os dispositivos gráficos vão se transformando”, observa Matuck.

Como fugir do óbvio

Galeria Casa da Xiclet reúne músicos, pintores, escritores, atores – Foto Cecília Bastos/USP Imagens

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Quatro décadas de uma arte pioneira bem merecem um espaço à altura. Quem sabe o MAC ou a Pinacoteca. “Eu não quis passar por nenhuma burocracia para expor em um espaço onde você passa por um conselho e formalidades.” Matuck procurou um lugar apropriado, que tivesse sintonia com a sua arte. Decidiu pela Casa da Xiclet Galeria, um lugar aberto a todos que pretendem expor, cantar, encenar, palestrar…
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A proprietária da galeria, Xiclet, e a curadora Fernanda Bonfante – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

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“É uma alegria ter o trabalho de um artista tão importante aqui em nosso espaço”, observa a proprietária Xiclet, enquanto passa um café de coador para quem estiver por lá. Ela tem razão. Arthur Matuck é um nome internacional. Participou como artista convidado das Bienais de São Paulo de 1983, 1987, 1989, 1991 e 2002. Organizou o Projeto Reflux, um evento internacional de telecomunicação e arte, considerado pioneiro como proposta estética colaborativa em redes. Criou o conceito Semion – um Sinal Internacional para Informação Liberada, como alternativa inovadora para os direitos de propriedade intelectual na era digital. E, desde 1995, desenvolve pesquisas sobre as formas híbridas de criação textual.
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Exposição reúne trabalhos pontuais do artista – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

Arte de Matuck é sempre uma surpresa –Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

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Para fazer a curadoria de sua exposição, Matuck, amigo de críticos, curadores e artistas de várias partes do mundo, convidou Maria Fernanda Bonfante Rosalem, paulista de Rio Claro, mestranda e sua orientanda no Programa Interunidades de Estética e História da Arte. “Desde o início muito aberto, criativo, estimulando os alunos, Matuck me convidou para ter essa experiência de curadoria, produção e montagem de sua retrospectiva incompleta”, conta Fernanda.

Quando comentou que tinha alguns trabalhos, iniciei um processo de aproximação de suas obras e fui tendo a dimensão da sua produção, tendo contato com suas experiências e trajetórias artísticas, especialmente quando explora mídias e comunicação. Como artista-autor, o Matuck percorre, através de narrativas intrínsecas à visualidade, variedades comunicacionais. Assim, para realizar a exposição, planejei explorar um diálogo entre o espaço da própria galeria e um ensaio de suas distintas mídias e obras.

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O artista dialoga com o cotidiano político e social – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens


Liberdade criativa

Fernanda teve o cuidado de percorrer os trabalhos pontuais da trajetória de Matuck. “Estão presentes na mostra alguns exercícios individuais de expressão artística, como o desenho experimental-instrucional, a escrita, passando pela década de 70, quando propôs-se a discutir paradigmas então dominantes, iniciando o pioneirismo em áreas de direitos autorais, sinalizando internacionalmente a liberação da informação, como reflete em seu trabalho Semion – um Sinal para Informação Liberada.”

Os trabalhos mais importantes de Matuck estão reunidos na galeria. “Não estão dispostos em uma ordem cronológica. É a primeira vez que faço uma curadoria, mas a mostra é resultado de um trabalho conjunto com o artista”, explica Fernanda.

A galeria fica na Rua Fradique Coutinho 1.855. Tem o muro grafitado com uma caixa de chiclete. É só entrar, descer alguns degraus e lá está a galeria descontraída, convidativa para uma conversa ou para ficar observando em silêncio. Fernanda dispôs os trabalhos com a mesma informalidade com que foram feitos. Estão na forma original, pendurados com grampos. São telas, fotos, xerox emoldurados só pela sua própria história. Em um deles Matuck define a ausência, o vazio com as marcas deixadas pelos objetos retirados da paisagem, como, por exemplo, o círculo de um copo que já não existe.

Um artista e duas cabeças

Matuck apresenta também a performance Kapolengo, exibida em Moscou no final do ano passado. Fundamenta-se como uma entidade híbrida, o Kapolengo Medformer, projetado para transportar em apenas um corpo duas cabeças falantes, a sua própria acompanhada de outra, um vídeo falante, aparentando emergir de um só corpo.
Kapolengo é um projeto concebido para introduzir questões sobre identidade, migrações, envolvendo comunicação interpessoal, representação de minorias e estrangeiros, autorrepresentação, percepção de classe e gênero”, esclarece Matuck. “É resultado de décadas de um trabalho em continuidade em artes midiáticas e ciências humanas, em teoria e prática de performance em estudos e cultura visuais.”

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Veja a performance no vídeo do YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=KU4GtjRkHLo

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Colóquio Meta-Autoria

No próximo dia 29 de abril, às 16h , o professor Arthur Matuck vai apresentar o colóquio Estratégias na Produção Artística Contemporânea: Proposta Incompleta da Meta-Autoria. Para participar do evento, é preciso se inscrever pelo e-mail casadaxiclet@gmail.com. O colóquio tem uma taxa de participação de R$ 30,00.

“A Meta-Autoria fundamenta-se numa perspectiva do processo criativo presente em muitas obras contemporâneas de arte e tecnologia”, afirma o professor. “Este conceito desdobra a criação em estágios distintos e sucessivos: o primeiro, chamado metatexto, atua como gerador, determinador do segundo, o texto propriamente dito, que atualiza o metatexto, realizando o projeto enunciado. Propõe-se, assim, uma nova conceituação dos processos de criação e produção.”
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Galeria de imagens da exposição
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Exposição Medium Art: Uma retrospectiva incompleta pode ser apreciada até 30 de abril. De quinta-feira a sábado, das 14h às 20h, e domingo, das 14h às 18h. Local: Casa da Xiclet Galeria (Rua Fradique Coutinho 1.855, Vila Madalena, São Paulo)


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