Hélio Oiticica, o labirinto e o espaço público no Brasil

Texto traz a proposta do artista plástico Hélio Oiticica para discutir a produção de um novo pensar artístico no Brasil

 23/01/2018 - Publicado há 6 anos     Atualizado: 21/08/2018 as 16:59

Para Oiticica, o labirinto “é como mergulho na interioridade e subjetividade da arte” – Foto: Public Domain Pictures via Pixabay – CC

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A arte de Hélio Oiticica é um legado atemporal, material de pesquisa inesgotável devido à modernidade e contundência de suas criações, discutidas por vários especialistas cujos textos compõem a edição especial da revista ARS, dedicada ao artista plástico brasileiro. Oiticica viveu a época de um movimento transgressor surgido na década de 1960: a contracultura, que se caracterizou pela contestação dos padrões estabelecidos, com a proposta de novos rumos e novos valores para a arte, a cultura, a economia, a política e a sociedade. Nesse contexto, o artigo de Guilherme Wisnik traz a proposta deste artista para discussão do conceito de público no Brasil e sua integração com os “labirintos” na produção de uma arte inovadora, consoante com as novas ideias sociais e políticas que resultaram em um novo pensar artístico no Brasil.

Na música, o movimento da Tropicália é um bom exemplo desse novo caminho, já que a intenção era provocar rupturas, deixar de lado antigos padrões relativos às músicas e letras de canções, aos vestuários e comportamentos. Surgem novos costumes em que a liberdade se tornou condição fundamental para esse novo sentir as coisas e o mundo, “como uma forma de mobilização e contestação social utilizando novos meios de comunicação em massa”. Em seu artigo, Guilherme Wisnik aborda a questão do sentido de valor do espaço público e do labirinto na arte de Hélio Oiticica, comparando a relevância atribuída a essa questão pelos americanos e a dificuldade dos artistas brasileiros em lidar com o assunto. Mesmo assim, o autor aponta a vantagem do Brasil, “subvertendo o espaço de frequência pública de museus e galerias substituindo a noção de público pela de circuito”.

O texto resgata a simbologia do labirinto, estimulada pela experiência de Hélio Oiticica na favela do morro da Mangueira, em 1964, na medida em que a inclusão da música, da dança, despertou, no artista, a consciência artística inspirada na “arquitetura natural” dos espaços “labirínticos” das favelas. Como diz Wisnik, para Oiticica, o labirinto “é como mergulho na interioridade e subjetividade da arte”. O artista plástico investiu nas experiências centradas no corpo, materializadas no Parangolé, uma espécie de performance com tecidos, como uma dança em que impera a livre expressão do corpo no espaço urbano aberto da cidade, explorando a “arte das ruas, das coisas inacabadas, dos terrenos baldios” e não “parques e jardins modernos”.

Se no caso de Oiticica o espaço do labirinto era subjetivo e um refúgio interior, em Cildo Meireles o labirinto é o espaço urbano visto como lugar de proibições – Foto: Public Domain Pictures via Pixabay – CC

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Wisnik cita Cildo Meireles, também um dos mais importantes artistas plásticos contemporâneos que lida com os temas espaço público e labirinto. Meireles transforma objetos comuns como motores, elásticos e talheres em objetos artísticos, concedendo-lhes um sentido não costumeiramente atribuído a eles e inserindo o público como participante ativo de suas criações e instalações. Desdobrando a questão simbólica do labirinto, que, como vimos, é determinante na obra de Hélio Oiticica, Cildo Meireles mostra o impasse dessa questão. Se no caso de Oiticica o espaço do labirinto era subjetivo e um refúgio interior, em Cildo Meireles o labirinto é o espaço urbano visto como lugar de proibições.

Para o autor, a arte pública brasileira dos anos 1960 “alcançou resultados mais contundentes subvertendo o espaço de frequência pública de museus e galerias”. Ressaltando, assim, que a esfera pública precisa se concretizar no País e, “ao lado disso, e não por acaso, podemos identificar um histórico alheamento das cidades brasileiras em relação à presença da arte, que se espelha também em uma tímida cultura pública do meio artístico em questão”.

Guilherme Teixeira Wisnik é professor doutor do Departamento de História da Arquitetura e Estética do Projeto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.

WISNIK, Guilherme Teixeira. Dentro do labirinto: Hélio Oiticica e o desafio do “público” no Brasil. ARS, São Paulo, v. 15, n. 30, p. 95-110, out. 2017. ISSN: 2178-0447. DOI: http://dx.doi.org/10.11606/issn.2178-0447.ars.2017.132781. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/ars/article/view/132781. Acesso em: 25 nov. 2017.

Margareth Artur / Portal de Revistas da USP


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