Identificado mecanismo que reduz imunidade após infecção generalizada

Descoberta pode gerar novo alvo para tratamento de pacientes que tiveram sepse, mais suscetíveis a infecções posteriores

 04/04/2017 - Publicado há 7 anos     Atualizado: 24/04/2018 as 11:00
Eventos desencadeados pela sepse comprometem equilíbrio do sistema imune e deixam sobreviventes mais vulneráveis a infecções e morte – Foto: Pixabay/CC

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Pesquisa desenvolvida pelo Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (
Crid), com sede no campus da USP em Ribeirão Preto, ajuda a entender a causa da imunossupressão que se desenvolve em pacientes sobreviventes à sepse, representando uma nova perspectiva para prevenir mortes prematuras. 

Conhecida popularmente como infecção generalizada, a sepse atinge cerca de 670 mil pessoas por ano no Brasil e representa um gasto pelo sistema hospitalar de aproximadamente R$ 17 bilhões – R$ 10 bilhões com pacientes que acabam morrendo –, segundo dados do Instituto Latino-Americano de Sepse (Ilas). Ela é causada quando uma infecção por micróbios, como bactérias ou vírus, não é controlada e desencadeia uma resposta inflamatória sistêmica no organismo. Isso leva ao desenvolvimento de lesões nos tecidos do corpo e pode resultar na morte do paciente por falência múltipla dos órgãos, ou seja, o dano é tão grande que eles simplesmente deixam de funcionar. 

Segundo o professor José Carlos Farias Alves Filho, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP e um dos pesquisadores principais do Crid, existem diferentes graduações de gravidade da sepse. A forma mais grave delas é o choque séptico, que gera um sério comprometimento dos órgãos. Estima-se que cerca de 50% dos pacientes com choque séptico vêm a óbito, sendo ele, portanto, a principal causa de mortes em pacientes de UTI.

No entanto, o problema do paciente séptico não termina com a alta hospitalar. “Vários estudos em pacientes que sobrevivem à sepse demonstram que eles ficam com sequelas que podem durar anos, entre elas neurológica, como redução de memória, cardiovascular e imunológica. A sequela imunológica é caracterizada por uma imunodisfunção que resulta em uma maior suscetibilidade a infecções e também uma maior propensão ao desenvolvimento de tumores, devido à redução da imunovigilância”, explica o pesquisador.

Estudo realizado pela pós-doutoranda Daniele Carvalho Nascimento, orientada por Alves Filho, identificou parte do mecanismo envolvido no desenvolvimento da imunodisfunção pós-sepse. Os pesquisadores demonstraram que, paralelamente à resposta inflamatória sistêmica que ocorre durante a sepse, o corpo produz uma citocina chamada Interleucina 33 (IL-33). Essa substância desencadeia uma resposta de reparo dos tecidos nos pacientes que sobrevivem à fase aguda. 

“Observamos que, quando a infecção primária é controlada, o que acontece no caso dos sobreviventes à sepse, o organismo ativa um mecanismo de reparo dos danos que aconteceram nos tecidos. Esses reparos envolvem a geração de um subtipo de macrófagos conhecido como M2, que é induzida pela IL-33. Os macrófagos M2 produzem uma série de fatores que promovem reparo tecidual”, conta Alves Filho. 

Porém, paralelamente à produção de fatores de reparo tecidual, os macrófagos M2 liberam mediadores como a Interleucina 10 (IL-10) e a proteína TGFβ, que também estão envolvidos na geração de linfócitos T reguladores (Treg), um tipo de célula do sistema imunológico capaz de suprimir a imunidade do indivíduo. “Esses linfócitos geralmente estão presentes em todas as pessoas, mas em número controlado. Entre outras funções, eles são importantes para a manutenção da tolerância imunológica, evitando o desenvolvimento de doenças autoimunes espontâneas”, explica o docente.

No entanto, a elevação no número de linfócitos Treg pode levar a uma imunossupressão, deixando o indivíduo mais suscetível a infecções. No caso de pacientes que sobrevivem à sepse, infecções secundárias que são de simples solução para pessoas sadias podem levar à morte. “Portanto, se conseguirmos evitar o aumento descontrolado das células Treg ou as ações supressoras, poderemos barrar essa imunossupressão e, consequentemente, aumentar a expectativa de vidas desses pacientes”, diz Alves Filho. 

Os resultados obtidos no estudo foram publicados na última edição da revista Nature Communication. Atualmente, Daniela está realizando parte do seu pós-doutorado na França, com bolsa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), em que busca entender mais detalhadamente de que forma os macrófagos M2 promovem o aumento dos linfócitos Treg após a sepse. 

O Crid é um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) financiados pela Fapesp.

Mais informações: crid@fmrp.usp.br

Thais Cardoso, de Ribeirão Preto


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