Planta de feijão biofortificada com nanopartículas contém mais ferro

Nos experimentos, folhas, caules e raízes absorveram nanopartículas de magnetita; há potencial para fortificar também os grãos

 09/01/2017 - Publicado há 7 anos     Atualizado: 23/04/2018 as 15:03
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Os experimentos com as plantas de feijão foram realizados na Universidad de Granma, em Cuba - Foto: Divulgação
Os experimentos com as plantas de feijão foram realizados na Universidad de Granma, em Cuba – Foto: Divulgação

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Naturalmente rico em ferro, o feijão é um dos alimentos mais consumidos em todo o mundo. Mas, no futuro, ele poderá ser ainda mais enriquecido com o mineral. Em estudo recentemente publicado no Journal of Nanoparticle Research pesquisadores brasileiros e cubanos mostraram, através de técnicas magnéticas, que o uso de nanopartículas de magnetita (Fe3O4) provocou aumento da concentração do ferro em diferentes órgãos da planta: raiz, caule e folhas. Os experimentos foram coordenados pelo professor Renato de Figueiredo Jardim, do Instituto de Física (IF) da USP, e foram feitos com plantas de feijão comum (phaseolus vulgaris L.) “Nossos estudos indicaram que há potencial para a aplicação de técnicas magnéticas para a detecção de material magnético em plantas e para o enriquecimento até mesmo dos grãos em plantas de feijão, mas até chegarmos lá dependeremos de mais pesquisas e de outros protocolos científicos”, explica o professor do IF.

Segundo o professor Jardim, existem diversas nanopartículas que são descartadas na natureza, os agora denominados “nanolixos”. Entre estes materiais nanoestruturados ele cita como exemplo os óxidos de zinco (ZnO), de cério (CeO2) e titânio (TiO2) usados nas indústrias de cosméticos e pigmentos, entre outras. “O simples fato de se usar um shampoo, por exemplo, já caracteriza o descarte destas nanopartículas”, exemplifica o cientista. Por outro lado, nanopartículas podem ser utilizadas para fins mais nobres como é o caso descrito aqui.

Instituto de Física, Professor Renato de Figueiredo Jardim - Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Renato de Figueiredo Jardim: nanopartículas utilizadas para fins mais nobres  – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Os experimentos foram realizados em laboratórios da USP e as plantas foram cultivadas em laboratórios da Universidad de Granma, em Cuba. “Foi lá que analisamos as plantas em todas as fases do crescimento, mas o ciclo foi interrompido antes do surgimento dos grãos”, explica Jardim. “Nosso objetivo era verificar a capacidade de as nanopartículas de magnetita atingirem as folhas a partir da raiz”, afirma, ressaltando que “Cuba está numa região de latitude no globo terrestre onde o consumo por humanos do feijão é muito grande.”

Sem toxicidade

Os estudos tiveram início em 2014 e as nanopartículas foram preparadas no Instituto de Química (IQ) da USP, sob a coordenação da professora Liane M. Rossi. As nanopartículas de Fe3O4 usadas tem medidas da ordem de 10 nanômetros (nm), sendo que um nanômetro corresponde a 1 milionésimo de milímetro. A partir daí, os experimentos foram realizados nos laboratórios da universidade cubana, onde as sementes foram plantadas, regadas com soluções de água com as nanopartículas e acompanhadas por cerca de 30 dias.

As nanopartículas, na forma de pó, foram adicionadas à água de irrigação das plantas em concentrações diferentes. “Acompanhamos, separadamente, a proliferação da solução nas raízes, nos caules e nas folhas”, conta Jardim. Ao todo, foram avaliados 4 conjuntos com duas plantas cada, totalizando 8 plantas. No primeiro conjunto, a irrigação foi feita apenas com água; no segundo 0,5 miligramas (mg) de Fe3O4 por litro de água; no terceiro, 1.0 mg por litro e, no quarto. 2.0 mg por litro de água.

As folhas não apresentaram alterações visíveis e não houve indícios de contaminação - Foto: Divulgação
As folhas não apresentaram alterações visíveis e não houve indícios de contaminação – Foto: Divulgação

Depois da secagem das diferentes partes das plantas, foram feitas análises com o uso de técnicas magnéticas (magnetização e susceptibilidade magnética) que permitiram aos cientistas avaliar o conteúdo de material magnético nas raízes, caules e folhas. Foi constatado uma alta concentração das nanopartículas nas plantas irrigadas com a solução contendo material magnético. “Houve uma absorção da ordem de 100 vezes maior de material magnético pelas raízes quando comparado com as raízes irrigadas com água pura e as nanopartículas magnéticas detectadas foram similares em tamanho às utilizadas nas soluções”, lembra o docente. Já as análises feitas nos caules das plantas indicaram que a absorção foi da ordem de 10 vezes maior que a irrigada com água pura. “Neste caso os sinais magnéticos foram proporcionais à quantidade de nanopartículas das soluções de irrigação”.

Nas folhas, segundo o pesquisador, a absorção de nanopartículas via solução foi algo ao redor de 2,5 vezes maior. “O tamanho estimado das nanopartículas detectado nas folhas foi de aproximadamente 10 nm, similar ao das nanopartículas das soluções; as folhas não apresentaram alterações visíveis e, o principal, foi que não houve indícios de contaminação nas plantas”, afirma Jardim. Entre as conclusões dos experimentos, ele destaca a constatação de que o material magnético foi transportado entre os órgãos da planta, constituindo uma rota segura de biofortificação, mesmo considerando que o material magnético não foi transferido 100%. Além disso, ficou comprovado também que a utilização de técnicas magnéticas para análise foi bastante eficiente.

Além do professor Jardim e da professora Liane, assinam o artigo os cientistas da Universidad de Granma (Ernesto Govea Alcaide, Angel de Souza Torres e Lillien Fajardo Rosabal), Sueli H. Masunaga do IF (USP) e Fernando B. Effenberger, do Centro Universitário FEI.

Mais informações: e-mail rjardim@if.usp.br


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