Cultura da violência é fruto da impunidade decorrente da ditadura

Corte Interamericana deve condenar o Estado brasileiro nos próximos dias, revela filho de Vladimir Herzog

 15/05/2018 - Publicado há 6 anos

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A embaixada brasileira em Washington solicitou ao governo dos Estados Unidos o acesso aos documentos produzidos pela agência de inteligência norte-americana, a CIA, durante o período da ditadura militar no Brasil. A determinação do Itamaraty é uma resposta ao pedido feito por Ivo Herzog, fundador do Instituto Vladimir Herzog e filho do jornalista assassinado pelo regime. Para Ivo, a divulgação recente do documento que liga o ex-presidente Geisel à execução de opositores políticos é uma prova de que não havia “porões”, mas, sim, “palácios da ditadura”.    

Ivo Herzog comenta que as revelações sobre Geisel mudam o entendimento que se costuma ter sobre esse período histórico. Conhecer o passado, diz ele, é importante para a compreensão dos dias atuais. A política de Estado de repressão, tortura e assassinato não cessou com o fim da ditadura militar. Amarildo, Marielle e o massacre do Carandiru são exemplos da manutenção da cultura da violência pela Polícia Militar, completa. Essa tradição, segundo ele, é alimentada pela impunidade.

Brasil reconhece 168 anistiados políticos – Foto: Maria do Resguardo / Divulgação / Agência Brasil via Governo do Brasil

A Lei da Anistia, promulgada em 1979, garantiu que agentes do Estado, além de opositores do regime, não seriam punidos pelos crimes cometidos à época. A decisão é contestada desde então e hoje parecem maiores as chances de revisão desse entendimento pelo Supremo Tribunal Federal, segundo avaliação de Ivo e declaração da procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat. Nesse sentido, Ivo concorda quando dizem que é preciso “virar a página” da história, mas lembra a necessidade de que a página esteja escrita antes de ser deixada para trás.   

Uma nação sem memória não pode ter identidade e soberania, afirma Ivo Herzog. Ele diz, ainda, que quem acabou com a soberania brasileira foi o próprio Estado, pela destruição, por exemplo, dos documentos do período ditatorial pelo Exército. Ele lembra que o Brasil está precisando recorrer a outro país para resgatar a história nacional. A falta de registros dificulta, também, o trabalho da Comissão da Verdade, responsável por trazer à luz parte dos fatos acontecidos entre 1964 e 1985.

Concluindo, Ivo Herzog revela que a Corte Interamericana de Direitos Humanos deve divulgar nos próximos dias uma sentença de condenação severa contra o Estado brasileiro. O conteúdo ainda não é conhecido, mas Ivo tem esperanças, pelo histórico e pelo transcorrer do processo, que o documento deve “colocar o dedo” na Lei da Anistia. Ele diz ser muito importante ações desse tipo: são parte de uma política de reparação e memória, que são algumas das dimensões do trabalho da Corte.

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