De acordo com o decreto redigido pelos deputados Lakanal e Garat: “será estabelecida em Paris uma Escola Normal, para onde serão chamados, de todas as partes da República, cidadãos já iniciados nas ciências úteis para o aprendizado da arte de ensinar, sob a direção dos professores os mais hábeis em todos os gêneros”.
A lista dos primeiros mestres não deixa dúvidas sobre a ambição do projeto, tendo sido composta de Monge, Vandermonde, Daubenton e Berthollet, além do escritor Bernardin de Saint-Pierre e do filósofo Volney, este último muito apreciado entre os republicanos das letras luso-brasileiros.
As revoluções de 1789, 1830, 1848 e 1870 certamente impactaram uma instituição comandada pelas mentes mais brilhantes do país, concorrendo, todavia, para o seu fortalecimento, pois jamais um governante ousou enfraquecer sua vocação maior, a saber, o desenvolvimento científico da nação, segundo os princípios da Convenção (1794-1795).
O edifício da Rue d’Ulm foi fundado em 1847, sobre as vinhas do antigo convento das Ursulinas. Frequentaram o pensionato da ENS – sim, a escola abriga até nossos dias, em seus corredores, alunos e professores – Pasteur, Rocard, Kastler, de Gennes, Jaurès, Bloch, Febvre, Le Goff, Giraudoux, Péguy, d’Ormesson, Bergson, Sartre, Aron, Foucault, Pompidou, Blum, Louis Althusser… que acaba de receber uma bela homenagem, sob a forma do documentário L’Aventure Althusser, síntese emocionante daqueles anos feéricos em que a política e a filosofia, noutros termos, o comunismo e o marxismo se mantiveram no primeiro plano do debate acadêmico francês.
A École Normale Supérieure se apresenta como uma instituição de pesquisa e de formação de excelência no quadro das grandes escolas francesas. Como podemos ver no frontão do pórtico central do edifício da prestigiosa Rue d’Ulm, ela é filha do Iluminismo, tendo sido fundada no 9 Brumário, ano III da Revolução (1794).
O que hoje representa a Rue d’Ulm? Uma instituição de notório saber que abriga pesquisadores de todo o mundo e que se mantém zelosa da missão de formar professores para o sistema universitário francês, além, é claro, do fomento à pesquisa. Ela guarda o princípio da divisão paritária entre os recursos destinados às chamadas ciências duras e às humanidades.
A bem da verdade, excetuando os recursos materiais e tecnológicos à disposição dos professores nas salas de aula e nos laboratórios, não parece exagerado dizer que tudo funciona como nos tempos de antanho, quando mestres e alunos entretinham uma relação de respeito e de reconhecimento mútuo de seus saberes e de suas funções.
A biblioteca é o testemunho mais eloquente dessa comunhão entre passado-presente-futuro. A seção de Letras, Ciências Humanas e História ocupa o primeiro andar de todo o conjunto que conforma a ENS, com faces voltadas para a Rue d’Ulm, Rue Rataud e Rue Erasme (escusado dizer o quanto os topônimos locais são tributários das ciências desenvolvidas na École).
Essa distribuição particular das salas conduz o leitor a uma espécie de dédalo forrado de estantes e de livros, escadarias, nichos de leitura e de depósito de volumes, os quais remontam a épocas distintas, facilmente percebidas por seu décor. O sistema de livre acesso permite ao pesquisador ir muito além de um catálogo frio, disposto na tela do computador.
O edifício da Rue D’Ulm foi fundado em 1847, sobre as vinhas do antigo convento das Ursulinas. Frequentaram o pensionato da ENS – sim, a escola abriga até nossos dias, em seus corredores, alunos e professores – Pasteur, Rocard, Kastler, de Gennes, Jaurès, Bloch, Febvre, Le Goff, Giraudoux, Péguy, d’Ormesson, Bergson, Sartre, Aron, Foucault, Pompidou, Blum, Louis Althusser… que acaba de receber uma bela homenagem, sob a forma do documentário L’Aventure Althusser, síntese emocionante daqueles anos feéricos em que a política e a filosofia, noutros termos, o comunismo e o marxismo se mantiveram no primeiro plano do debate acadêmico francês.
E esses volumes impressos, pesados e volumosos não parecem incomodar os administradores e a comunidade acadêmica. Pedidos de aquisições são recebidos e, salvo nos casos de edições especiais, de difícil acesso, o título visado chegará às mãos do requerente em um prazo máximo de uma semana. Sem dúvida, uma grande inovação possibilitada pela tecnologia, como faz questão de explicar a bibliotecária.
Respaldada por uma longa tradição universitária francesa, sem, no entanto, perder de vista a vocação renovadora que se espera de uma instituição desse porte, a École Normale Supérieure se reinventa sob o dogma da mundialização. Prova-o o seu mais notável laboratório ligado à escola doutoral, o Labex-Transfers, dirigido por Michel Espagne, sob o concurso da ENS, do Collège de France e do CNRS. Sob essa rubrica, um vasto território de saberes onde a transdisciplinaridade e a internacionalização não se apresentam apenas como um horizonte a ser atingido sob o viés da teoria.
Trata-se, efetivamente, de uma realidade, de um modus operandi. Nada mais coerente, afinal, que uma instituição fundada sob a marca dos direitos universais defenda a produção científica como expressão da universalidade, da diversidade e do livre pensar. Esta, sem dúvida, constitui a maior e a melhor lembrança da Rue d’Ulm.